26 de dezembro de 2021

A Queda da Casa de Usher

Durante todo aquele triste, escuro e silencioso dia outonal, com o céu encoberto por nuvens baixas e opressivas, estive percorrendo sozinho, a cavalo, uma região rural singularmente deserta, até que enfim avistei, com as primeiras sombras da noite, a melancólica Casa de Usher. Não sei por quê, mas, assim que entrevi a construção, um sentimento de intolerável tristeza apoderou-se de meu espírito. Digo intolerável porque essa impressão não era suavizada por qualquer sensação meio prazenteira, porque poética, com que a mente geralmente recebe até mesmo as mais sombrias imagens naturais de desolação e de terror. Observei a paisagem à minha frente: a casa simples e a simplicidade do aspecto da propriedade, as paredes frias, as janelas semelhando órbitas vazias, os poucos canteiros com ervas daninhas e alguns troncos esbranquiçados de árvores apodrecidas? e senti na alma uma depressão profunda que não posso comparar a nenhuma sensação terrena senão ao que experimenta, ao despertar, o viciado em ópio: o amargo retorno à vida cotidiana, o terrível descair de um véu. Havia um frio, uma prostração, uma sensação de repugnância, uma irrecuperável aflição de pensamento que nenhum excitamento da imaginação conseguiria forçar a transformar-se em algo sublime. Que era, parei para pensar, que era que tanto em perturbava ao contemplar a Casa de Usher? Era um mistério completamente insolúvel, e eu não conseguia controlar as sombrias imagens que me enchiam a cabeça enquanto refletia isso. Fui forçado a socorrer-me da conclusão nada satisfatória de que existem, sem dúvida, combinações de objetos naturais muito simples, que têm o poder de nos afetar assim, embora a análise desse poder se situe em considerações além de nossa perspicácia. Era possível, pensei, que um mero arranjo diferente nos pormenores da cena, dos detalhes do quadro, bastasse para modificar, ou talvez, parar suprimir sua capacidade de provocar impressões aflitivas. Com essa ideia na cabeça, guiei o cavalo até a margem íngreme de um fosso negro e sinistro cujas águas paradas refulgiam junto a casa e contemplei, com um arrepio ainda mais forte do que antes, a imagem invertida e modificada dos arbustos cinzentos, dos lívidos troncos de árvores e das janelas semelhantes a órbitas vazias.

Apesar disso, era nessa desolada mansão que eu tencionava passar algumas semanas. O proprietário, Roderick Usher, havia sido um de meus joviais amigos de infância, mas muitos anos tinham se passado desde o nosso último encontro. Uma carta, no entanto, que me chegara recentemente numa parte distante do país? uma carta dele? exigia pela insistência de seu teor resposta pessoal. A caligrafia revela agitação nervosa. O remetente falava de aguda doença física, de opressiva perturbação mental e do intenso desejo de me ver, como seu melhor e na verdade único amigo pessoal, com a intenção de lograr, pela alegria de minha companhia, algum alívio para sua doença. A maneira pela qual tudo isso e muito mais coisas foram ditas e o manifesto estado de espírito expresso no pedido impediram-me qualquer hesitação e por esse motivo obedeci na mesma hora ao que ainda considerava como um convite muito estranho.

Apesar de, quando crianças, termos sido companheiros íntimos, eu na verdade, conhecia pouco meu amigo. Sua reserva sempre tinha sido excessiva e habitual. Eu sabia, no entanto, que sua família, muito antiga, distinguia-se havia muito tempo pela peculiar sensibilidade de temperamento, demonstrada ao longo de muitos séculos em notáveis obras de arte e que ultimamente se manifestava em repetidos atos de generosa e discreta caridade e também na apaixonada devoção pela complexidade da ciência musical, talvez ainda mais do que por suas belezas naturais e fáceis de reconhecer. Fiquei sabendo também de um fato incrível: o tronco da linhagem dos Usher, embora tão antiga, nunca tinha produzido qualquer ramo duradouro. Em outras palavras, a família se perpetuara apenas em linha direta e assim continuava, com variações bem poucos importantes e temporárias. Era essa deficiência, pensava eu, enquanto repassava em pensamento a perfeita harmonia entre o aspecto da propriedade e o caráter de seus moradores, imaginando a possível influência que aquela podia ter exercido, ao longo dos séculos, sobre estes ? era essa deficiência, talvez, de um ramo colateral e a conseqüente transmissão direta, de pai para filho, do patrimônio e do nome da família que haviam ao longo dos tempos identificado ambas de tal modo que fundiram o título original da propriedade na estranha e equívoca designação de Casa de Usher ? designação que, na mente dos camponeses que a utilizavam, parecia servir tanto para a família quanto para a mansão da família.

Eu disse que o único efeito da minha experiência um tanto infantil de olhar para o fosso havia sido aprofundar aquela primeira impressão. Sem dúvida, quando tomei consciência do rápido aumento de minha superstição (por que não usar esse termo?), isso serviu principalmente para intensificar o próprio aumento. Tal é, sei disso há muito tempo, a lei paradoxal de todos os sentimentos fundados no terror. E pode ter sido por essa única razão que, ao levantar os olhos de sua imagem no fosso para a própria mansão, surgiu-me na mente uma estranha visão? tão estranha, de fato, que só a menciono para mostrar a intensa força das sensações que me sufocavam. Minha imaginação mostrava-se tão excitada que realmente acreditei que em volta da mansão e da propriedade pairava uma atmosfera especial, própria do lugar e de seus arredores, atmosfera que não se relacionava como o ar do céu, emanando antes das árvores apodrecidas, das paredes cinzentas, do fosso silencioso? um vapor místico e pestilento, espesso, entorpecido, sutil e lívido.

Afastando do espírito o que devia ser um sonho, examinei mais atentamente o aspecto real do edifício. Sua característica principal parecia ser a extrema antiguidade. Fora grande a descoloração causada pelos séculos. Minúsculos fungos cobriam todo o exterior, pendendo dos beirais qual fina e emaranhada teia. Mas nada disso indicava grande destruição. Nenhum bloco de alvenaria tinha desmoronado, mas parecia haver um profundo contraste entre o encaixe ainda perfeito das partes e as péssimas condições de cada pedra. Isso me lembrou muito a enganosa integridade de antigas peças de madeira que apodreceram por longos anos em algum porão esquecido, sem serem perturbadas pelo sopro do ar exterior. Afora esse indício de grande decadência, porém, a construção não mostrava nenhum sinal de falta de segurança. Talvez o olho de um observador mais atento conseguisse descobrir uma fenda quase imperceptível que riscava a frente do edifício desde
o telhado, descendo em ziguezague pela parede até mergulhar nas águas turvas do fosso.

Observando tudo isso, atravessei a cavalo o curto carreiro que levava até a casa. Um cavalariço levou minha montaria, e avancei pelo arco gótico do vestíbulo. Um criado de andar furtivo conduziu-me então, calado, por muitas passagens escuras e tortuosas, até o gabinete de seu patrão. Muitas das coisas que vi pelo caminho contribuíam, não sei como, para fortalecer os imprecisos sentimentos de já falei. Os objetos à minha volta? os entalhes do forro, as sombrias tapeçarias das paredes, o negrume de ébano do assoalho e as fantasmagóricas armaduras que retiniam quando eu passava? eram coisas com que eu estava, ou devia estar familiarizado desde a infância, mas, embora não hesitasse em reconhecê-las como tais, ainda me espantava ao perceber como eram estranhas as visões que essas imagens tão comuns produziam em mim. Numa das escadas, cruzei com o médico da família. Julguei ver em sua fisionomia uma expressão desanimada e perplexa. Cumprimentou-me agitado e afastou-se. O criado então abriu uma porta e me levou até a presença de seu patrão.

Achei-me numa sala muito ampla e alta. As janelas, compridas, estreitas e pontudas, tinham peitoris tão afastados do assoalho de carvalho negro que era impossível alcança-los. Fracos raios de luz avermelhada penetravam pelas vidraças guarnecidas com rótulas, só conseguindo tornar visíveis os objetos próximos mais volumosos. O Olhar, porém, lutava em vão para perceber os cantos mais distantes da sala ou os recessos do forro em abóbada guarnecido com entalhes. Sombrias cortinas pendiam das paredes. O mobiliário era excessivo, desconfortável, antigo e gasto. Os muitos livros e instrumentos musicais que jaziam dispersos não conseguiam dar vitalidade alguma ao ambiente. Senti que respirava uma atmosfera de tristeza. Um ar de severo, profundo e irrecuperável desalento pairava sobre as coisas e impregnava a tudo.

Assim que entrei, Usher levantou-se do sofá onde estava deitado ao comprido e cumprimentou-me com calorosa vivacidade, na qual havia muito, de início julguei, de cordialidade forçada, do esforço constrangido de um homem de sociedade entediado. Mas, olhando seu rosto, convenci-me de sua perfeita sinceridade. Sentamos e, por alguns momentos, como ele não falava nada, fiquei olhando-o com um sentimento misto de piedade e espanto. Com toda a certeza, nenhum homem jamais se transformara tão terrivelmente, em período tão curto, quanto Roderick Usher! Só com muita dificuldade consegui admitir que o homem doentio diante de mim era o mesmo companheiro de infância. No entanto, suas feições sempre tinham sido notáveis: tez cadavérica; olhos grandes, líquidos e luminosos, sem comparação; lábios um tanto finos e muito pálidos, mas de conformação extremamente bela; o nariz, com delicado desenho hebraico, mas exibindo narinas largas, incomuns nesse tipo; o queixo finamente delineado, revelando, pela ausência de volume, carência de energia moral; cabelos mais finos e macios que os fios de uma teia. Todos esses traços e mais o extraordinário desenvolvimento da fronte combinavam-se num aspecto difícil de esquecer. E agora, com o mero exagero desses traços e da expressão que costumavam mostrar, havia tal mudança que cheguei a duvidar de que era com ele que falava. A cadavérica palidez da pele e o brilho agora sobrenatural dos olhos, acima de tudo, surpreendiam-me e até me aterravam. O cabelo sedoso também tinha crescido descuidadamente e como, por causa da textura muito fina, flutuasse em vez de cair nos lados do rosto, eu não conseguia, mesmo com esforço, vincular sua expressão fantástica com qualquer ideia de simples humanidade.

Fiquei abalado ao perceber logo certa incoerência nas maneiras de meu amigo, certa inconsistência, e logo descobri que isso se devia a uma série de fracos e inúteis esforços para dominar tremor frequente, uma excessiva agitação nervosa. Eu estava preparado para encontrar algo assim, não só por sua carta, mas também pela lembrança de certos traços juvenis e pelas conclusões deduzidas de seu estado físico e de seu temperamento. Suas atitudes alternavam da vivacidade ao desânimo. A voz variava, rapidamente, passando da trêmula indecisão (quando seu ardor parecia tornar-se profundamente entorpecido) para o tipo de energética concisão, para a abrupta, pesada, lenta e oca articulação, para a fala arrastada, controlada, gutural e perfeitamente modulada que se pode observar nos bêbados costumazes e nos fumadores de ópio irrecuperáveis, durante os períodos mais intensos de excitação.

Foi assim que ele se referiu ao objetivo de minha visita, de seu grande desejo de me ver e do alívio que esperava encontrar em minha companhia. Depois, falou por algum tempo do que achava da natureza de sua doença. Segundo ele, era um mal de família e de nascença, para o qual já tinha perdido a esperança de encontrar remédio; mera perturbação nervosa, disse logo em seguida, que sem dúvida ia passar logo. A doença se manifestava numa série de sensações antinaturais. Algumas, enquanto as ia descrevendo, me deixaram interessado e confuso, apesar talvez de que tenham influído os termos usados e a forma geral da descrição. Ele sofria, e muito, de doentia exageração dos sentidos: só tolerava o mais insípido alimento; não podia usar senão roupas de determinadas texturas; os perfumes de todas as flores pareciam-lhe sufocantes; até a luz mais suave lhe torturava os olhos e só os sons especiais dos instrumentos de cordas não lhe provocavam horror.

Compreendi que ele estava escravizado por uma espécie anormal de terror.

– Vou morrer? disse ele? Devo morrer nesta loucura lamentável. Assim, assim e de nenhuma outra forma é que vou me perder. Abomino os fatos do futuro, não em si mesmos, mas por seus resultados. Estremeço diante da ideia de qualquer incidente, até mesmo o mais trivial, que possa afetar essa intolerável agitação da alma. Não tenho, na verdade, aversão pelo perigo, a não ser em seu efeito absoluto: o terror. Neste deplorável estado de abatimento sinto que mais cedo ou mais tarde chegará um momento em que vou ter de abandonar ao mesmo tempo a vida e a razão, na luta com o fantasma sinistro do MEDO.

Descobri também, aos poucos e através de pistas equívocas fragmentadas, outro traço singular de seu estado mental. Ele estava acorrentado a certas impressões supersticiosas quanto à casa em que morava e da qual, por longos anos, não se aventurava a sair… a uma influência, cuja suposta força foi narrada em termos vagos demais para reproduzir aqui… influência que alguns detalhes da matéria e da forma da mansão familiar tinham, às custas de longo sofrimento, conseguindo exercer sobre seu espírito… efeito físico que as paredes e torres cinzentas e o sombrio fosso onde elas refletiam tinham acabado por exercer sobre o moral de sua existência.

Ele admitia, porém, embora com hesitação, que grande parte do desalento que sofria talvez tivesse origem mais natural e bem mais palpável: na séria e prolongada doença (na verdade, na morte evidentemente próxima) de uma irmã adorada, sua única companheira por longos anos, sua única e última parenta nesta terra.

– A morte dela? disse ele, com amargura que nunca esquecerei? tornará (a ele, fraco e sem esperanças) o último representante da antiga raça dos Usher.

Enquanto falava, Lady Madeline (pois era assim que se chamava) passou pela parte mais distante do aposento e, sem notar minha presença, desapareceu. Olhei-a com profunda surpresa e uma ponta de medo? e, no entanto, não encontrava explicação para esses sentimentos. Uma sensação de estupor me sufocava, enquanto seguia com os olhos seus passos. Quando uma porta, afinal, se fechou atrás dela, meu olhar procurou instintiva e ansiosamente o irmão, mas este escondera o rosto nas mãos, e só pude perceber que uma palidez maior que a normal tinha tomado conta dos dedos magros, pelos quais escorriam muitas lágrimas emocionadas.

A doença de Lady Madeline vinha desafiando, por muito tempo, a habilidade dos médicos. Apatia permanente, progressivo enfraquecimento físico e crises frequentes, mas passageiras, caráter parcialmente cataléptico eram o diagnóstico incomum. Até então ela tinha resistido firmemente contra o avanço da doença, recusando-se a cair de cama, mas no final da tarde de minha chegada ela sucumbiu (como me contou o irmão, à noite, com indescritível agitação) ao poder destruidor do mal. E compreendi que a visão de relance de seu vulto seria provavelmente a última e que não veria mais a moça, pelo menos com vida.

No decorrer dos dias seguintes, seu nome não foi mencionado por Usher ou por mim. Durante esse período dediquei-me vivamente a aliviar a melancolia de meu amigo. Pintávamos e líamos juntos; ou eu ouvia, como num sonho, as arrebatadas improvisações que ele fazia em sua eloquente guitarra. E assim, à medida que aumentava a intimidade que ia me revelando os recessos mais íntimos de seu espírito, mais amargamente eu percebia quão inúteis seriam as tentativas de alegrar aquela mente da qual a escuridão, como uma qualidade inerente e ativa, vertia sobre todos os objetos do mundo físico e moral uma incessante radiação de tristeza.

Ficarão para sempre gravadas em minha memória as muitas horas solenes que passei a sós como o chefe da Casa de Usher. Mas nunca conseguiria dar uma ideia do caráter exato dos estudos ou das ocupações em que ele me envolvia ou me conduzia. Uma idealidade excitada e altamente desequilibrada lançava um brilho sulfuroso sobre todas as coisas. Suas longas cantigas fúnebres soarão para sempre em meus ouvidos. Entre outras coisas, lembro-me dolorosamente de certa estranha alteração e amplificação da romântica melodia da última valsa de Von Weber. Quanto às pinturas em que extravasava sua elaborada fantasia e que se metamorfoseavam, pincelada por pincelada, até atingir uma indefinição que me causava estremecimentos ainda mais emocionantes, pois eu não sabia por que estremecia? quanto a essas pinturas (tão vívidas que até hoje tenho suas imagens diante dos olhos) em vão me esforçaria para retirar delas apenas uma pequena parte, passível de ser traduzida por simples palavras escritas. Através da extrema simplicidade e crueza do desenho, ele retinha e dominava a atenção. Se algum mortal jamais pintou uma ideia, esse mortal foi Roderick Usher. Para mim, pelo menos, na situação em que então em encontrava, dessas puras abstrações que o hipocondríaco conseguia projetar nas suas telas surgia um terror intenso e intolerável, assombro que nem de longe jamais senti nas fantasias (sem dúvida brilhantes) de Fuseli, mas ainda assim concretas demais.

Uma das criações fantasmagóricas de meu amigo em que esse espírito abstrato não era tão rígido pode ser descrita, ainda que pobremente, em palavras. Era um quadro pequeno, representando o interior de uma câmara ou túnel imensamente longo e retangular, com paredes baixas, lisas, brancas e sem qualquer interrupção ou adornos. Certos detalhes do desenho conseguiam dar muito bem a ideia de que essa escavação ficava a uma extrema profundidade, abaixo da superfície da terra. Não se via qualquer abertura em toda a sua vasta extensão nem se percebiam tochas ou qualquer outra fonte de luz artificial. No entanto, uma torrente de intensos raios jorrava, tudo banhando num esplendor cadavérico e antinatural.

Falei há pouco do estado mórbido do nervo auditivo, que tornava intolerável qualquer música para esse sofredor, com exceção de certos efeitos de instrumentos de cordas. Foram, talvez, os estreitos limites a que ele se limitava na guitarra que deram origem, em grande parte, ao caráter fantástico de suas execuções. Mas a fervorosa facilidade de seus improvisos era inexplicável. Deviam ser e eram, tanto nas notas quanto nas palavras de suas loucas fantasias (pois ele muitas vezes acompanhava a música com improvisações verbais rimadas), resultado da intensa e imperturbável concentração mental de que já falei antes, só observáveis nos momentos de maior excitação artificial. Lembro-me facilmente das palavras de uma dessas rapsódias. Fiquei, talvez, tão impressionado quando ele as cantou, porque, na corrente subjacente ou mística de seu significado, julguei perceber, pela primeira vez, que Usher tinha plena consciência da instabilidade de sua mente altiva sobre seu trono. Os versos, intitulados “O Palácio Assombrado”, eram quase exatamente assim:

I

No mais verde de nossos vales,

Por bons anjos habitado,

Outrora um belo e rico palácio,

Radiante palácio, se erguia.

Nos domínios do rei Pensamento,

Lá estava ele!

Nunca serafim algum abriu as asas

Sobre tão bela obra.

II

Bandeiras amarelas, gloriosas, douradas,

Em seus telhados flutuavam, ondulando

(Isso, tudo isso, ocorreu nos velhos tempos

De antigamente)

E toda suave brisa que brincava,

Naqueles doces dias,

Pelos muros pálidos e engalanados,

Um sublime perfume desprendia.

III

Quem passava por esse vale feliz

Por duas janelas luminosas via

Espíritos deslizando, musicais,

Ao som de alaúde bem afinado,

Em volta de um tronco, onde sentava-se

(Porfirogênito (!)

Na grandeza de sua glória muito justa,

O senhor desse reinado.

IV

Pela bela porta do palácio

Brilhante com pérolas e rubis,

Ia passando, passando, passando,

E sempre mais cintilando,

Uma tropa de Ecos cujo doce dever

Era apenas cantar

Com vozes de insuperável beleza,

A viva sabedoria do rei.

V

Mas vultos maus, trajados de luto,

Atacaram o alto reino do monarca;

(Ah, choremos, pois nunca mais

O dia vai nascer para ele, o desolado!)

E, em volta do palácio, a glória

Que brilhava e florescia

Não passa agora de mal lembrada história

Dos velhos tempos sepultados.

VI

E quem passa agora pelo vale,

Pelas janelas rubras vê

Enormes formas que fantásticas se movem,

Ao som de melodia discordante;

Enquanto isso, como rio terrível,

Pela pálida porta se precipita

Para sempre uma hedionda multidão

Que gargalha, mas não mais sorri.

Lembro-me bem de que as sugestões despertadas pela balada nos levaram a uma linha de pensamento em que se tornou manifesta uma opinião de Usher, que menciono não tanto por causa de sua novidade (pois outros homens (2) já pensaram desse modo), mas devido à insistência com que ele a defendia. Essa opinião, em termo gerais, afirmava que todos os vegetais têm sensibilidade. Mas, na imaginação desordenada de Usher, essa ideia tinha assumido caráter ainda mais ousado e chegava, sob certos aspectos, ao reino das coisa inorgânicas. Não encontro palavras para expressar toda a extensão, ou melhor, a sincera espontaneidade de sua convicção. Tal crença, no entanto, relacionava-se (como já insinuei antes) com as pedras cinzentas da mansão e seus antepassados. As condições para essa sensibilidade eram realizadas, imaginava ele, no método de colocação das pedras e na ordem com que tinham sido organizadas, assim como na dos muitos fungos que as cobriam e nas árvores agonizantes que existiam em volta, mas, acima de tudo, na longa e imperturbável duração desse arranjo e na sua duplicação nas águas paradas do fosso. A prova (a prova dessa sensibilidade) podia ser encontrada, dizia ele (e me assustei ao ouvir tal coisa), na lenta, mas inegável condensação de uma atmosfera que lhes era própria em torno das águas e das paredes. O resultado podia ser percebido, acrescentou ele, na influência silenciosa, mas perturbadora e terrível, que vinha moldando havia séculos o destino de sua família e que fizera dele, como eu podia ver agora, aquilo que ele era. Essas opiniões dispensam comentário e não farei nenhum.

Nossos livros? os livros que durante anos constituíram grande parte da existência mental do doente? estavam, como se pode supor, em harmonia absoluta com esse caráter fantasmagórico. Lemos juntos, atentamente, obras como Vert Vert e a epístola La Chartreuse, de Gresset; Belphegor, de Maquiavel; Céu e inferno, de Swendenborg; Viagem subterrânea de Nils Klimm, de Holberg; Quiromancia, de Robert Flud, de Jean D`Indaginé e de De la Chambre; Jornada às distâncias azuis, de Tieck; e Cidade do sol, de Campanella. Um dos volumes preferidos era uma pequena edição in-oitavo do Directorium Inquisitorum, do padre dominicano Eymerico de Gerona; e havia passagens de Pomponius Mela (3), sobre os velhos sátiros africanos e mitológicos, sobre os quais Usher era capaz de sonhar durante horas. Seu maior prazer, no entanto, era a leitura de um raro e curioso livro em gótico in-quarto, o manual de uma igreja esquecida, as Vigiliae Mortuorum secundum Chorum Ecclesiae Maguntinae.

Eu não podia deixar de pensar no estranho ritual descrito nesse livro e na sua provável influência sobre o hipocondríaco quando, uma noite, depois de me informar repentinamente que Lady Madeline havia morrido, ele disse que tinha intenção de manter o corpo por quinze dias (antes do enterro definitivo) em uma das muitas câmaras subterrâneas existentes no interior da mansão. A razão profana para essa estranha atitude, no entanto, era tal que não me sentia à vontade para discutir. Como irmão, tinha sido levado a essa resolução (assim me contou ele) por causa da natureza incomum da doença da falecida, de certas perguntas inconvenientes e ansiosas feitas pelos médicos e por causa da localização distante e exposta do jazigo da família. Não posso negar que, ao lembrar do rosto sinistro da pessoa que encontrei na escada no dia em que cheguei àquela casa, não senti nenhum impulso para me opor a uma preocupação que me parecia inofensiva e de forma alguma antinatural.

A pedido de Usher, ajudei-o nos preparativos do sepultamento provisório. Depois de colocar o corpo no caixão, nós dois, sozinhos, o levamos até o lugar de descanso. A câmara em que o deixamos (e que estivera fechada por tanto tempo que nossas tochas, quase apagadas pela atmosfera abafada, não nos permitiram examinar) era pequena, úmida, sem nenhuma entrada para a luz e situada a grande profundidade, exatamente debaixo da parte da mansão onde estava o meu quarto de dormir. Aparentemente, tinha sido usada em remotos tempos feudais para as piores finalidades de cárcere privado e, mais recentemente, como depósito de pólvora ou de alguma outra substância altamente inflamável, pois parte do chão e todo o interior da longa arcada que percorremos para chegar até ali estavam cuidadosamente revestidos de cobre. A porta, de ferro maciço, tinha sido igualmente protegida. Quando girava as dobradiças, seu imenso peso fazia um som incrivelmente agudo e áspero.

Após depositar nossa triste carga sobre cavaletes nesse horrendo lugar, abrimos parcialmente a tampa do caixão, ainda não parafusada, e olhamos o rosto da morta. A incrível semelhança entre irmão e irmã me chamou a atenção, e Usher, adivinhando talvez meus pensamentos, explicou-me num murmúrio que ele e a falecida eram gêmeos e que afinidades de natureza quase incompreensível sempre existiram entre eles. Mas nossos olhares não se demoraram muito tempo sobre a morta, pois era impossível fitá-la sem se perturbar. A enfermidade que assim levara ao túmulo a jovem senhora tinha deixado, como é normal em todas as doenças de natureza estritamente cataléptica, um arremedo de coloração no seio e no rosto e uma sombra de sorriso nos lábios, que é tão terrível na morte. Recolocamos e parafusamos a tampa do caixão e, fechando a porta de ferro, voltamos abatidos para os cômodos pouco menos sinistros dos andares superiores da mansão.

Então, passados alguns dias de amarga tristeza, ocorreu uma nítida mudança nos sintomas da perturbação mental de meu amigo. Seu modo de ser habitual desapareceu. Suas ocupações diárias eram negligenciadas ou esquecidas. Ele vagava a esmo de sala em sala, com passos apressados e irregulares. A palidez de seu rosto assumiu, se isso é possível, um tom ainda mais cadavérico, mas a luminosidade de seus olhos dissipou-se completamente. Não se ouvia mais o tom áspero de sua voz, como às vezes sucedia antes, e um trêmulo balbucio, como se estivesse tomado de horror extremo, passou a caracterizar o seu modo de falar. Houve momentos, na verdade, em que pensei que sua mente sempre agitada estava em luta com algum segredo opressivo, empenhando-se em reunir coragem para contá-lo. Outras vezes era eu levado a atribuir tudo aquilo à inexplicável confusão da loucura, pois o via fitar o vazio durante horas, numa atitude da mais profunda atenção, como se estivesse ouvindo algum som imaginário. Não era de admirar que seu estado me causasse terror e me contaminasse. Senti-me aos poucos, inexoravelmente, invadido pela estranha influência de suas fantásticas, mas impressionantes superstições.

Foi especialmente ao me deitar, já tarde da noite, sete ou oito dias depois de colocarmos o corpo de Lady Madeline na câmara, que percebi toda a força de tais sentimentos. O sono não se aproximava de minha cama e as horas ecoavam-se lentamente. Lutei para controlar o nervosismo que me dominava. Esforcei-me por acreditar que muito, senão tudo o que estava sentindo, se devia à perturbadora influência da soturna mobília do aposento, das tapeçarias escuras e esfarrapadas que, movidas pelo sopro de uma tempestade que se formava, oscilavam de modo irregular nas paredes e roçavam inquietas pelos adornos do leito. Mas meus esforços foram inúteis. Um tremor incontrolável aos poucos tomou conta de meu corpo e, afinal, instalou-se sobre meu próprio coração o íncubo de uma comoção inteiramente infundada. Sacudindo essa sensação com um arquejo e um sobressalto, ergui-me dos travesseiros e, sondando com o olhar a escuridão do aposento, prestei atenção e ouvi? não sei por quê, talvez por um instinto que me aguçou o espírito? ruídos baixos e indefinidos que nas pausas da tempestade, a longos intervalos, vinham não sabia de onde. Dominado por forte sentimento de horror, inexplicável e por isso mesmo impossível de suportar, vesti-me rapidamente (pois senti que seria impossível dormir naquela noite) e tentei livrar-me, caminhando de um lado para outro pelo aposento, do estado penoso em que me achava.

Logo depois de iniciar as idas e vindas, um leve ruído de passos numa escada próxima me chamou a atenção. Logo reconheci que era Usher. No instante seguinte, ele bateu de leve em minha porta e entrou, trazendo um lampião. Seu rosto estava, como sempre cadavérico, mas além disso havia uma espécie de riso louco em seus olhos, e, e, seu modo de proceder, uma histeria evidentemente contida. Seu aspecto me aterrou, mas qualquer coisa era preferível à solidão por mim suportada durante tanto tempo e acolhi sua presença com grande alívio.

– E você não o viu? perguntou ele de repente, depois de olhar em volta por alguns momentos, sem silêncio? Não o viu? Mas espere! Você vai ver.

Assim dizendo? e enquanto protegia cuidadosamente o lampião? correu para uma das janelas e a escancarou para a tempestade.

A impetuosa fúria das rajadas de vento quase nos levantou do chão. Era na verdade uma noite tempestuosa, mas ainda assim bela e espantosamente singular no seu terror e perfeição. Aparentemente, um redemoinho juntara todas as suas forças ao nosso redor pois ocorriam frequentes e violentas mudanças na direção do vento, e a extrema densidade das nuvens (tão baixas que pareciam pesar sobre os torrões da mansão) não nos impedia de observar a viva velocidade com que deslizavam de todos os pontos, chocando-se umas contra as outras, sem desaparecer ao longe. Digo que nem mesmo a sua extrema densidade nos impossibilitava de perceber isto, embora não pudéssemos vislumbrar a lua ou as estrelas, nem havia ali qualquer clarão de relâmpagos. Mas tanto a superfície inferior das imensas massas de vapor agitando como todos os objetos terrenos das proximidades brilhavam, por efeito de uma luz antinatural que provinha de uma exalação gasosa ligeiramente luminosa e perfeitamente visível que envolvia toda a mansão como uma mortalha.

– Você não deve… não pode ficar olhando para isso!? eu disse, estremecendo, a Usher, enquanto o afastava com leve violência da janela e o fazia sentar? Essas manifestações que tanto perturbam vocês são meros fenômenos elétricos, nada incomuns, ou talvez tenham origem nas exalações malcheirosas do fosso. Vamos fechar esta janela. O ar está gelado e é perigoso para sua saúde. Eis aqui um de seus romances favoritos. Vou ler para você, e assim passaremos juntos esta noite terrível.

O volume antigo que peguei era o Mad Trist (Assembleia dos loucos) de Sir Launcelot Canning. Disse que era um dos favoritos de Usher mais como triste gracejo do que a sério, pois, na verdade, sua prolixidade vulgar e estéril muito pouco continha que pudesse interessar à idealidade elevada e espiritual de meu amigo. Era, porém, o único livro à mão? e nutri a vaga esperança de que a excitação que então agitava o hipocondríaco talvez encontrasse algum alívio (pois a história das perturbações mentais está cheia de anomalias desse tipo), até mesmo nos excessos de imaginação que eu ia ler. A julgar pelo ar de intensa vivacidade como que ouvia, ou parecia ouvir a leitura, podia congratular-me pelo êxito de minha tentativa.

E Ethereld, que tinha por natureza coração audaz e agora se sentia muito forte, graças ao vigor do vinho que havia bebido, não gastou mais tempo em discutir com o eremita, que em verdade tinha caráter obstinado e malicioso. Sentindo a chuva nos ombros e temendo que caísse a tempestade, levantou a maça e, com vários golpes, logo abriu espaço nas tábuas da porta, para passar a mão com luva de ferro; brandindo-a com firmeza, quebrou e lascou e despedaçou de tal foram a madeira que o eco desse ruído seco e oco alarmou toda a floresta.

Ao terminar esta frase, assustei-me e parei por um momento, pois em parecia (embora logo concluísse que estava sendo iludido por minha excitada imaginação), me parecia que, de algum ponto remoto da mansão, chegava indistintamente a meus ouvidos algo que, por sua exata semelhança, podia ser o eco (apesar de baixo e abafado) do ranger e estalar que Sir Launcelot descrevia tão detalhadamente. Era, sem dúvida, apenas a coincidência que me chamava a atenção, pois que, em meio do bater dos caixilhos das janelas e dos ruídos da tempestade crescente, o som nada tinha, por certo, que pudesse me interessar ou perturbar. E continuei com a história:

Mas o bom paladino Ethelred, entrando agora pela porta, ficou dolorosamente enraivecido e surpreendido por não encontrar nem sinal do malicioso eremita, mas sim, em seu lugar, um dragão coberto de escamas, de aparência prodigiosa e com língua de fogo, que guardava um palácio de ouro com chão de prata. E sobre a muralha pendia um escudo de bronze reluzente onde estava escrita a legenda:

Quem aqui penetrar, conquistador será;
Quem o dragão matar, o escudo ganhará.

E Ethelred levantou a maça e golpeou a cabeça do dragão, que caiu a seus pés, exalando o pestilento suspiro com um guincho tão horrível, áspero e penetrante que Ethelred teve de tapar os ouvidos com as mãos para suportar aquele terrível som, como jamais tinha ouvido antes.

Aqui, outra vez parei abruptamente, agora com a sensação de tremenda surpresa, pois não podia haver qualquer dúvida de que, desta vez, ouvi realmente (embora fosse impossível dizer de onde provinha) um grito ou rangido baixo, aparentemente distante, mas áspero, prolongado, singularmente agudo e dissonante, a exata reprodução daquilo que minha fantasia imaginava como o guincho do dragão descrito pelo romancista.

Oprimido, como eu naturalmente estava, diante dessa Segunda e tão extraordinária coincidência, por mil sensações conflitantes, nas quais predominavam a perplexidade e o extremo terror, consegui ainda manter suficiente presença de espírito para não aguçar, com qualquer observação, a sensibilidade nervosa de meu companheiro. Não tinha certeza de que ele houvesse percebido os ruídos em questão, embora, sem dúvida, uma estranha alteração tenha ocorrido nos últimos minutos em seu rosto. Sentado diante de mim, fez girar pouco a pouco a cadeira até ficar de frente para a porta do aposento, de forma que eu só podia ver parcialmente seu rosto, apesar de perceber que seus lábios tremiam, como se estivesse murmurando baixinho. Pendeu a cabeça, mas eu sabia que não estava adormecido, porque o olho que via de perfil se mantinha muito aberto e fixo. O movimento de seu corpo também desmentia essa ideia, pois oscilava de um lado para o outro com um balanço suave, embora constante e uniforme. Tendo notado rapidamente tudo isso, voltei para a narrativa de Sir Launcelot, que continuava assim:

E agora o paladino, tendo escapado à terrível fúria do dragão e lembrando-se do escudo de bronze e da quebra do encantamento que sobre ele pesava, afastou a carcaça do caminho e valorosamente avançou pelo chão de prata do castelo na direção da parede em que pendia o escudo, o qual, na verdade, não esperou que ele chegasse até perto, caindo-lhe aos pés sobre o chão prateado, com horrendo e retumbante estrondo.

Nem bem essas palavras me passaram pelos lábios, ouvi distintamente como se um pesado escudo de bronze de fato tivesse caído, naquele momento, sobre um chão de prata? uma reverberação nítida, surda, metálica e poderosa, apesar de aparentemente abafada. Inteiramente nervoso, fiquei em pé de um salto, mas o movimento regular de balanço de Usher não se alterou. Corri para a cadeira diante de si e todo o seu rosto apresentava rigidez de pedra. Mas, assim que lhe toquei o ombro com a mão, forte estremecimento sacudiu todo o seu corpo, um sorriso doentio brincou em seus lábios como se não tivesse consciência de minha presença. Inclinando-me sobre ele, pude afinal compreender o sentido terrível de suas palavras.

– Não ouve, agora?… Sim, estou ouvindo e já ouvi antes. Há muitos, muitos, muitos, muitos minutos, muitas horas, muitos dias, venho ouvindo… e, no entanto, não tive a coragem…

Oh, pobre de mim, miserável infeliz!… não tive coragem… não tive coragem de falar! Nós a enterramos viva! Eu não disse que meus sentidos eram aguçados? Agora lhe digo que ouvi os primeiros movimentos dela no caixão. Ouvi-os… há muitos, muitos dias… mas não tive coragem… não tive coragem de falar! E agora… esta noite… Ethelred… ha! há!… o rompimento da porta do eremita e o grito de morte do dragão e clangor do escudo!… Seria melhor dizer o destroçar do caixão e o ranger das dobradiças de ferro de sua prisão e sua luta lá dentro das arcadas de cobre da cripta! Oh, para onde é que vou fugir? Pois ela não vai chegar agora mesmo? Não está vindo apressadamente para censurar minha sofreguidão? Não são seus passos que ouço na escada? Não é a batida pesada e horrível de seu coração que estou ouvindo? Louco!? e aqui levantou-se, de um salto, furioso, e berrou cada sílaba, como se estivesse entregando a própria alma nesse esforço? Louco! Digo-lhe que ela está agora, atrás da porta!

Como se a energia sobre-humana de suas palavras produzisse a força de um encantamento, a imensa e antiga porta para a qual apontava foi abrindo lentamente, nesse instante, suas mandíbulas negras e pesadas. Havia sido obra do vento furioso? mas além da porta estava de fato a figura alta e amortalhada de Lady Madeline de Usher. Havia sangue em suas vestes brancas e sinais de violenta luta por todo o seu corpo emagrecido. Por um momento ela permaneceu trêmula e vacilante no umbral. Depois, com um gemido baixo e queixoso, caiu pesadamente sobre o irmão, e em sua violenta e agora final agonia. Arrastou-o consigo para o chão, já morto, vítima dos terrores que tinha previsto.

Fugi aterrorizado daquele quarto e daquela mansão. A tempestade ainda soprava com toda a fúria lá fora, quando atravessei o carreiro. De repente fulgurou sobre o caminho uma luz fantástica, e me virei para ver de onde podia provir luminosidade tão estranha, pois atrás de mim só havia a vasta casa e suas sombras. A irradiação vinha da lua cheia e cor de sangue, já baixa no horizonte, e brilhava agora vivamente através daquela fenda antes quase invisível, à qual já me referi, que descia em ziguezague do teto até a base do edifício. Enquanto eu a olhava, a fenda foi se alargando rapidamente… soprou uma feroz rajada de vento… O círculo inteiro do satélite tornou-se visível aos meus olhos… Meu cérebro vacilou quando vi aquelas sólidas paredes desmoronarem… ouviu-se um longo e desordenado estrondo, como o retumbar de mil cataratas… e o fosso fétido e profundo, a meus pés, fechou-se, tétrica e silenciosamente, sobre os restos da Casa de Usher.

Edgar Allan Poe

(1) Porfirogênito: Significa, em grego, “nascido na púrpura”. Dizia-se dos filhos dos antigos imperadores do Oriente nascidos durante o reinado do pai.

(2) Watson, Dr. Percival, Spallanzani e especialmente o Bispo de Llandaff. Ver Chemical essays, v.V. Richard Watson (1737 - 1816), químico inglês e bispo de Llandaff. James Gates Percival (1795? 1856), erudito norte-americano. Lazzaro Spallanzani (1729 - 1799), naturalista Italiano.

(3) Jean Baptiste Louis Gresset (1709 - 1777), poeta e dramaturgo francês; Niccolò Maquiavel (1469 - 1527), político e escritor italiano; Emanuel Swedenborg (1688 - 1772), cientista e filósofo sueco; Ludvig Holberg (1684 - 1754), escritor dinamarquês; Robert Flud (1574 - 1637), médico inglês; Jean D`Indaginé é a grafia francesa para Joannes Indagine, pseudônimo de Johann von Hagen (séc XVI), escritor alemão; Marin Cureau De la Chambre (1596 - 1669) médico francês; Ludwig Tieck (1773 - 1853), escritor alemão; Tommanso Campanella (1568 - 1639), filósofo italiano; Nicolás Eymerico (1320 - 1399), teólogo espanhol; Pomponius Mela (séc. I d.C.), geógrafo Latino.

24 de novembro de 2021

Academia Independente de Letras

Academia de Letras é uma instituição de cunho literário e linguístico, que reúne uma quantidade limitada de membros efetivos, numa tradição iniciada no Século XVII com a Academia francesa. O termo "academia" remonta à Academia de Platão - escola fundada pelo célebre filósofo grego nos jardins que um dia teriam pertencido ao herói Akademus (donde vem o nome). Ali buscava-se, pelo dialética socrática, o saber pelo questionamento e pelo debate. 

Ao contrário da Escola de Isócrates, onde o conhecimento consistia na mera repetição do saber. Foi com esta ideia de debates, que diversas instituições literárias surgiram em França, entre as décadas de 1620 a 1630 - consolidando-se na matriarca de todas as agremiações literárias - a citada Académie… 

Ao Brasil, com certo atraso, foram fundadas: Academia Brasílica dos Esquecidos (Bahia, 1724) Academia dos Felizes (Rio de Janeiro, 1736) Academia dos Selectos (Rio de Janeiro, 1751 ou 1752) Academia Brasílica dos Renascidos (na Bahia, revivendo a dos Esquecidos, de vida breve - em 1759) Muitas outras vieram das quais apenas a francesa subsistiu - tendo também sido a única oficializada pelo Estado. 

Após a fundação da Academia Brasileira de Letras, foram sendo constituídas Academias em cada Estado da Federação brasileira. Sem possuir a grandiosidade e importância da Brasileira, várias delas constituem-se ativas e importantes espaços para a divulgação da literatura local e reconhecimento dos valores estaduais, neste mister, destacam-se, nos dias atuais, a Academia Paulista de Letras e a Academia Cearense de Letras. A Carioca já ocupou lugar de destaque, mas hoje, assim como a Baiana, não tem conseguido manter o nível de atividade do passado. 

No Brasil, com a proliferação de entidades literárias, muitas cidades não reuniam "literatos" em número suficiente para que viessem a justificar a fundação de um "silogeu". Vieram, assim, as Academias "mistas": de "letras e artes" (em tese, todo "artista" pode ser membro); de "letras e música", etc. De outro lado, certas categorias profissionais ou associativas, reunindo em seu bojo muitos escritores, passaram a criar Academias específicas: médicos, militares, maçons, passaram também a ter "suas" próprias Academias de Letras, nominadas como no caso dos formados em Direito, das chamadas academias "de Letras Jurídicas". 

Muitas cidades têm na sua Academia o órgão literário máximo, no qual se reúnem-se os expoentes locais e regionais. Com o advento da tecnologia e da internete, academias virtuais passaram a unir escritores de diversos lugares em apenas um espaço virtual, democratizando e difundido de maneira nacional e internacional os escritores que fazem parte de uma, como é o caso da ACADEMIA INDEPENDENTE DE LETRAS (AIL) é uma associação civil de direito privado, com finalidades culturais, sem fins lucrativos, criada em 09 de junho de 2018.
Sendo que no dia 30 de Outubro de 2021, tive a oportunidade de me associar... 

5 de novembro de 2021

Vivien Leigh - Biografia

Vivien Leigh (nascida Vivian Mary Hartley e estilizado como Lady Olivier após 1947; Darjeeling, 5 de novembro de 1913  Londres, 8 de julho de 1967) foi uma atriz britânica nascida na Índia do Império Britânico.

Leigh tornou-se conhecida não somente nos palcos como também das telas. Numa carreira que se estendeu por mais de trinta anos, a atriz, que frequentemente fazia colaborações com seu marido, o ator e diretor Laurence Olivier: no teatro, viveu desde heroínas das comédias de Noel Coward e George Bernard Shaw às personagens dos dramas clássicos de Shakespeare, chegando a ganhar, em 1963, um Tony de melhor atriz pelo desempenho na comédia musical Tovarich; já no cinema, mesmo com relativamente poucas aparições (sua filmografia é composta de não mais que dezenove títulos), Leigh viveu personagens igualmente marcantes, cuja profundidade de suas atuações contribuíram para que a atriz conseguisse a notável façanha de conquistar por duas vezes o Oscar de melhor atriz: a primeira pelo desempenho como Scarlett O'Hara em ...E o Vento Levou, de 1939, e a segunda pela atuação em outro drama, Um bonde chamado desejo, de 1951, no qual interpretou o papel de Blanche DuBois, a mesma personagem a qual deu vida nos palcos do West End, área na região central de Londres, onde se concentram célebres teatros.

Não obstante seu sucesso, Leigh foi afetada por um distúrbio bipolar durante a maior parte de sua vida adulta, e seu humor era quase sempre não entendido pelos diretores, que lhe atribuíram uma reputação de atriz de difícil personalidade. Diagnosticada com tuberculose crônica na metade da década de 1940, sua saúde tornou-se frágil a partir de então. Ela e Olivier divorciaram-se em 1960; a partir daí, a atriz continuou a trabalhar esporadicamente no cinema e no teatro, até sua morte súbita em 1967, causada pela tuberculose que a atormentou durante anos.

Em 1999, o Instituto Americano de Cinema a classificou como a décima sexta maior estrela feminina do cinema clássico de Hollywood.

Vivien Leigh, cujo nome de batismo era Vivian Mary Hartley, nasceu em 5 de novembro de 1913 na cidade de Darjeeling, à sombra do Monte Everest, na Índia; Vivian chegara no final da era de ouro do Império Britânico. Vinda de uma família burguesa da Inglaterra, seu pai, Ernest Hartley, era agente de câmbio e, paralelamente, atuava no teatro amador. No fim da Primeira Guerra Mundial, ele levou a família de volta à Inglaterra. Aos seis anos de idade, sua mãe, Gertrude, decidiu interná-la no Convento do Sagrado Coração, mesmo sendo dois anos mais nova que qualquer outra aluna. O único conforto para a criança solitária era um gato que vagava pelo pátio do convento, e que as freiras a deixaram levar para o dormitório. Sua primeira e melhor amiga na escola era uma menina de oito anos, que mais tarde também se tornaria estrela: Maureen O'Sullivan, que viera da Irlanda. Na quietude do convento, as duas brincavam de recriar os lugares que haviam deixado, e imaginavam como seriam os que desejavam visitar. Lá, ela se destacou na dança, no violoncelo e nas peças de final de ano.

De 1927 a 1932, ela se juntou aos pais na Europa. Os Hartley haviam deixado definitivamente a Índia, onde Vivian nascera. Ela aprendeu a falar fluentemente o francês e o alemão, além de fazer um curso de dicção. Em 1932, aos dezoito anos, entrou na Academia Real de Artes Dramáticas de Londres; surpreendentemente, no entanto, ela saiu no outono do mesmo ano, quando decidiu se casar. Vivian conhecera e se apaixonara pelo jovem advogado Hebert Leigh Holman, de 31 anos, e os dois se casaram em 20 de dezembro de 1932. Logo em seguida, em 1933, nasceu a filha do casal, Suzanne Holman. Depois, retornou à Academia Real de Artes Dramáticas de Londres para concluir seus estudos e se tornar atriz.

Década de 1930

Primeiros trabalhos

Vivian fez teste e foi escolhida para um pequeno papel num filme chamado Things Are Looking Up (1935). Embora o papel fosse pequeno, chamou a atenção do empresário John Glidden, do qual ela se tornou cliente. Depois, no mesmo ano, veio um filme barato: The Village Squire. John Glidden também criou um nome artístico para Vivian, usando o primeiro nome dela e um sobrenome do marido. Pouco depois, o produtor Sidney Carroll sugeriu que a letra "a", do nome Vivian, fosse substituída pela letra "e", para dar mais feminilidade.

Vivien Leigh estreou nos palcos de Londres interpretando a esposa namoradeira em The Green Sash. Sua carreira deu uma guinada quando ela protagonizou a produção de Sidney Carroll da peça The Mask Of Virtue. A peça, que estreou em 15 de maio de 1935, foi um grande sucesso e rapidamente Vivien tornou-se conhecida no meio artístico de Londres.

Início do sucesso

Os elogios da crítica a Vivien, unidos à sua incomparável beleza, chamaram a atenção do produtor Alexander Korda, que a contratou por cinco anos. Antes de atuar no primeiro filme do contrato, Vivien atuou em três peças. Em 1937, Korda estava preparado para trabalhar com sua revelação no filme Fogo sobre a Inglaterra, um filme sobre a rainha Elizabeth I na época da Armada Espanhola. A atriz estava entusiasmada com o filme e especialmente contente porque iria trabalhar com Laurence Olivier, um ator que ela e seu marido conheciam socialmente. Laurence Olivier e Vivien Leigh ficaram íntimos demais durante a filmagem, e restava pouca dúvida de que os dois teriam se apaixonado. No mesmo ano, ao atuarem juntos na peça Hamlet, no Castelo de Elseneur, local da tragédia de Shakespeare, o sucesso foi enorme, a ponto do príncipe da Dinamarca vir vê-los. Depois disso, os jovens amantes perceberam que havia chegado a hora de falar a seus respectivos consortes do seu amor, e que queriam se divorciar para se casar. Vivien deixou definitivamente seu marido e foi morar com Olivier, deixando a educação de sua filha, Suzanne, por conta de sua mãe.

Em seguida, eles filmaram Três Semanas de Loucura, mas o filme foi considerado bobo e nem chegou a ser lançado (só o foi em 1940, quando ambos já eram astros).

Para o próximo filme, Alexander Korda emprestou Vivien à MGM (Metro Goldwin Mayer) para estrelar a produção inglesa Um Ianque em Oxford (1938), com Robert Taylor, então no auge da popularidade. O entusiasmo inicial de Vivien transformou-se em decepção quando ela soube que não interpretaria a protagonista, que acabou ficando para Maureen O'Sullivan, sua ex-colega de escola.

Scarlett O'Hara, o auge

Como Scarlett O'Hara em ...E o Vento Levou (1939)

Em 1938, Laurence Olivier foi contratado para interpretar Heathcliff na produção de Samuel Goldwyn Wuthering Heights (1939) (1939). Ele desejava que Vivien interpretasse seu par romântico no filme, que acabou ficando com Merle Oberon. Mais tarde, Vivien decidiu que precisava vê-lo, e partiu a bordo do navio Queen Mary. Dizem que, durante a viagem, ela ficava na cabine, lendo o livro ...E o Vento Levou, de Margaret Mitchell. A atriz não só estava ansiosa para rever seu amado, mas também planejava conquistar o papel de Scarlett O'Hara, a protagonista do filme ...E o Vento Levou, de 1939.

Vivien Leigh queria interpretar Scarlett havia muito tempo. O livro de Hugo Vickers, Vivien Leigh publicado em 1988, fala do que houve durante a produção de um filme na Inglaterra, em 1937: "Alguém disse a Laurence Olivier: 'Larry, você daria um ótimo Rhett Butler' (o par romântico da protagonista de ...E o Vento Levou, que acabou sendo interpretado por Clark Gable). Ele apenas riu, mas a discussão sobre o elenco prosseguiu, e Vivien causou um silêncio repentino ao dizer: 'Larry não será Rhett Butler, mas eu serei Scarlett O'Hara. Esperem e verão' ." Isso era, no mínimo, muito curioso, uma vez que ela era uma total desconhecida na América e na época havia muita divergência sobre quem deveria interpretar Scarlett. A escolha de sua intérprete fascinou o mundo. Centenas de mulheres fizeram testes, algumas desconhecidas e amadoras, de setembro de 1936 até dezembro de 1938, entre elas Tallulah Bankhead, Paulette Goddard, Jean Arthur, Joan Bennett, Lana Turner e Susan Hayward. O produtor do filme, David O. Selznick, sempre preferia achar uma atriz novata, algum rosto novo que não fosse identificado por papéis anteriores. Atrizes bastante famosas na época foram cotadas, mas por várias razões não fizeram o teste. Entre elas estavam Margaret Sullavan, Miriam Hopkins, Joan Crawford, Norma Shearer, Loretta Young, Bette Davis e Katharine Hepburn.

Leigh no trailer de Gone With the Wind.

Vivien dizia que o livro era maravilhoso e que daria um ótimo filme. Ouviram-na até dizendo: "Eu me escolhi como Scarlett O'Hara. O que acha?". Está claro que a atriz falava tanto de Scarlett na esperança que alguém da Selznick International Pictures registrasse seu interesse e investigasse o caso. Em seu livro de 1989, Vivien a Love Affair in Camera o fotógrafo Angus McBean escreveu sobre ela, a quem fotografara em inúmeras ocasiões, durante trinta anos. McBean relatou que em 1936 ele foi convidado a levar umas fotos até a casa dela em Londres. Nesse trecho, ela diz: "São maravilhosas (as fotos), Angus, querido. Como eu queria (interpretar Scarlett). Você leu o livro? 'Que livro?' ...E o Vento Levou, claro. É a minha Bíblia. E vou interpretar Scarlett nem que seja a última coisa que eu faça. Você não leu? Precisa ler." E ela lhe deu uma cópia do livro, com esta dedicatória: "Ao querido Angus, com amor. Scarlett O'Hara".

Em 1941 David O. Selznick (o produtor de ...E o Vento Levou) escreveu um artigo para uma revista, que dizia: "Antes que meu irmão, Myron Selznick, o maior empresário de Hollywood, levasse Laurence Olivier e Vivien Leigh para ver a cena do incêndio de Atlanta, eu nunca vira Vivien. Quando Myron nos apresentou, as chamas iluminavam o rosto dela, e ele disse: 'Quero apresentar Scarlett O'Hara'. Naquele momento, tive certeza de que era a atriz perfeita, pelo menos fisicamente". Mais tarde, os testes, feitos sob a brilhante direção de George Cukor, mostraram que ela seria a atriz ideal para o papel.

Depois de várias pré-estreias de gala em dezembro de 1939, ...E o Vento Levou tornou-se o filme mais famoso, mais assistido e mais aclamado da história, e Vivien Leigh, interpretando Scarlett, foi a força motriz dele. O clássico ganhou o impressionante número de dez prêmios Oscar (incluindo o de melhor filme e, também, o primeiro Oscar dado a uma atriz afro-americana, Hattie McDaniel). Foi aí que Vivien ganhou o primeiro de seus dois Oscars de melhor atriz.

Década de 1940

Durante a guerra

A Ponte de Waterloo, 1940

Depois do grande sucesso de ...E o Vento Levou, Vivien protagonizou o filme A Ponte de Waterloo (1940), da MGM. No mesmo ano, ela e Laurence [Olivier] fizeram Lady Hamilton, a Divina Dama , o filme preferido do primeiro-ministro Winston Churchill. Durante essa filmagem, souberam que seus respectivos divórcios tinham saído (mas o ex-marido da atriz ficou com a guarda da filha, Suzanne). Com isso, ela e Laurence finalmente casaram-se numa cerimônia íntima em Santa Barbara, no dia 31 de agosto de 1940.

Depois de atuar em uma montagem de The Doctor's Dilemma, Vivien fez turnê pelo norte da África para animar as tropas na Segunda Guerra. Ela e Olivier montaram em Londres The Skin Of Our Teeth, de Thornton Wilder, dirigida por Olivier e estrelada por Leigh. A peça fez grande sucesso mas, três meses depois da estreia, Leigh recebeu um diagnóstico de tuberculose, sendo obrigada a parar o trabalho e ficar convalescente por oito meses. A saúde de Leigh, sempre frágil, continuou ruim nos anos seguintes.

Sucesso contínuo

Em 1947, Laurence Olivier foi sagrado Cavaleiro do Império Britânico e o casal passou a ser Sir e Lady Olivier; os dois tornam-se o casal mais popular da Grã Bretanha, depois dos Windsors.

Em 1949, Vivien obteve o papel que só ficaria atrás de Scarlett: o de Blanche DuBois na peça teatral londrina Um bonde chamado desejo, de Tennessee Williams. A peça foi dirigida por Laurence Olivier e Vivien Leigh recebeu muitos elogios por seu desempenho no papel da frágil, desequilibrada e bela sulista.

Década de 1950

Blanche DuBois

Como Blanche DuBois em Uma Rua Chamada Pecado, 1951

Quando, em 1951, a Warner anunciou a versão filmada de A Streetcar Named Desire, pensou-se em Olivia de Havilland (com quem Vivien havia contracenado em ...E o Vento Levou) para o papel principal. Mas ofereceram o papel a Vivien, que recebeu cem mil dólares, tornando-se a atriz inglesa mais bem paga da época.

Vivien e Laurence não iam a Hollywood havia quase dez anos, e a chegada deles no outono de 1950 causou grande repercussão. Ele também ia fazer um filme lá: Perdição por Amor, de William Wyler, que já o dirigira antes em Wuthering Heights (1939).

Vivien Leigh teve um desempenho magnífico também no filme Um bonde chamado desejo e, por isso, foi recompensada com seu segundo Oscar de melhor atriz, mas seu trunfo teve um preço alto; ela diria depois: "Blanche DuBois é uma mulher da qual tudo foi arrancado, uma figura trágica e eu a entendo, mas interpretá-la me fez mergulhar na loucura."

Problemas de saúde

Vivien Leigh e Laurence Olivier trabalharam nas peças César e Cleópatra e Antônio e Cleópatra em noites alternadas, para o Festival da Grã Bretanha de 1951. Naquela época, a vida de Vivien estava mudando. Ela, que sofria de tuberculose, também sofreu dois abortos, e foi diagnosticada como maníaco-depressiva. Contudo, o público ainda a amava. Como o ritmo de trabalho era excessivo, a atriz começou a cair em longos períodos de depressão. De fato, ela teve de se afastar do trabalho durante boa parte de 1952. Sua volta ao trabalho, no filme No Caminho dos Elefantes (1953), só piorou as coisas: Vivien teve um colapso no set de filmagem e precisou ser substituída por Elizabeth Taylor. Em seguida, começaram os boatos sobre a situação de seu casamento com Olivier.

Década de 1960

Em 1958, aos 45 anos

Últimos anos

Em 1960 os boatos sobre a situação do casamento de Vivien Leigh e Laurence Olivier se confirmaram quando ele a abandonou para ficar com a comediante Joan Plowright, 22 anos mais nova do que ele. Ela pediu o divórcio por adultério, que foi concedido em 2 de dezembro de 1960. Depois disso, nunca mais se casou.

Em 1963, Vivien ganhou um Tony por seu desempenho na comédia musical Tovarich. No ano seguinte, ela voltou a Hollywood para viver outra sulista no filme A Nau dos Insensatos (1965).

Morte

Vivien Leigh ensaiava A Delicate Balance, de Edward Albee, em Londres, quando teve uma recaída (causada pela tuberculose que a atormentava havia décadas) e morreu, em 7 de julho de 1967, aos 53 anos. Na época, ela estava morando com o ator John Merivale. Seu corpo foi cremado e suas cinzas espalhadas no Lago no moinho Tickerage, perto de Blackboys, Sussex na Inglaterra.

Filmografia

AnoFilmeTítulo originalPersonagemDiretorOutros integrantes do elenco
1935The Village Squire(Idem)Rose VenablesReginald DenhamDavid Horne, Leslie Perrins
1935
(filmado em 1934)
Things Are Looking Up(Idem)Garota da escolaAlbert de CorvilleCicely Courtneidge
1935Look Up and Laugh(Idem)Marjorie BelferBasil DeanGracie Fields
1935Gentlemen's Agreement(Idem)Phil StanleyGeorge PearsonFrederick Peisley, Anthony Holles
1937Fogo sobre a Inglaterra"Fire Over England"CynthiaWilliam K. HowardFlora Robson, Raymond Massey, Leslie Banks,Laurence Olivier
1937Jornada sinistra"Dark Journey"Madeleine GoddardVictor SavilleConrad Veidt
1937Tempestade num copo d'água"Storm in a Teacup"Victoria "Vickie" GowIan Dalrymple, Victor SavilleRex Harrison, Cecil Parker, Sara Allgood
1938Um ianque em Oxford"A Yank at Oxford"Mrs. Elsa CraddockJack ConwayRobert Taylor, Maureen O'Sullivan, Lionel Barrymore, Edmund Gwenn
1938Nos bastidores de Londres"Sidewalks of London"Liberty "Libby"Tim WhelanCharles Laughton, Rex Harrison
1939...E o Vento Levou"Gone with the Wind"Katie Scarlett O'HaraVictor FlemingClark Gable, Olivia de Havilland, Leslie Howard
1940
(filmado em 1937)
Três semanas de loucura"21 Days"WandaBasil DeanLeslie Banks, Laurence Olivier
1940A ponte de Waterloo"Waterloo Bridge"Myra LesterMervyn LeRoyRobert Taylor, Lucile Watson, Virginia Field
1941Lady Hamilton, a divina dama"That Hamilton Woman!"Emma, Lady HamiltonAlexander KordaLaurence Olivier, Alan Mowbray, Sara Allgood, Gladys Cooper
1945César e Cleópatra"Caesar and Cleopatra"CleópatraGabriel PascalClaude Rains, Stewart Granger, Flora Robson
1948Anna Karenina(Idem)"Anna Karenina"Julien DuvivierRalph Richardson
1951Um Bonde Chamado Desejo"A Streetcar Named Desire"Blanche DuBoisElia KazanMarlon Brando, Kim Hunter, Karl Malden
1955O profundo mar azul"The Deep Blue Sea"Hester CollyerAnatole LitvakKenneth More
1961Em Roma na primavera"The Roman Spring of Mrs. Stone"Karen StoneJosé QuinteroWarren Beatty, Lotte Lenya
1965A nau dos insensatos"Ship of Fools"Mary TreadwellStanley KramerSimone Signoret, José Ferrer, Lee Marvin

Prêmios e Indicações

Oscar

  • 1940 - Melhor atriz por ...E o Vento Levou
  • 1952 - Melhor atriz por Um Bonde Chamado Desejo

BAFTA

  • 1953 - Melhor atriz britânica por Um Bonde Chamado Desejo

Festival de Cinema de Veneza

  • 1951 - Melhor atriz por Um Bonde Chamado Desejo

New York Film Critics Circle Awards

  • 1939 - Melhor atriz por ...E o Vento Levou
  • 1951 - Melhor atriz por Um Bonde Chamado Desejo

Sant Jordi Awards

  • 1951 - prêmio especial por Um Bonde Chamado Desejo

Globo de Ouro

  • 1952 - Indicada como melhor atriz dramática por Um Bonde Chamado Desejo

Tony Awards

  • 1963 - Melhor atriz em musical por Tovarich