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30 de janeiro de 2022

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Antologia sobre lugares sinistros. A ediรงรฃo fรญsica jรก acabou a tiragem mas tem conto no blog
CONTO COMPLETO: 

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Bem, esse meu primeiro conto foi publicado em e-book em 2020, mas tbm foi publicado em uma versรฃo resumida em livro em fรญsico em 2021, assim como outros livros com antologias, a tiragem foi baixa e jรก esgotou mas o conto completo tem disponรญvel por aqui:
CONTO COMPLETO 

1 de outubro de 2021

Antologia - Lugares Sinistros

Foto: Antologia "Lugares Sinistros"
Em "Lugares Sinistros" vai ter um jardim maravilhoso, cheio de flores e uma linda casa, mas o que um jardim florido teria de tรฃo sinistro? Para o pobre personagem que passeia por ele, vai ter muitas coisas. 
Foto: Conto de Evelyn Veiga,"O jardim da casa desconhecida"

Pode um parque de diversรตes, um hospital, um cemitรฉrio, um antigo orfanato ou uma casa abandonada abrigar mistรฉrios, casos sobrenaturais ou virar o local de um crime? Muitas vezes, lugares comuns e aparentemente inofensivos podem se tornar cenรกrios de histรณrias macabras e atรฉ mesmo crimes hediondos. 

A nova antologia LUGARES SINISTROS, da Dark Books Coletรขneas, reunirรก contos de terror, suspense e mistรฉrio. Use a sua criatividade para nos enviar seu conto sobre lugares que se tornaram malditos apรณs virarem palco para as mais assustadoras histรณrias.

27 de julho de 2021

Dica de Leitura: Coletรขnea Aterrorizante

Foto: Livro "Coletรขnea Aterrorizante"
Sinopse:
Antologia dividida em duas partes: Na primeira parte estรฃo reunidos os contos e na segunda parte estรฃo os poemas e as poesias. 
O livro tem como temรกtica histรณria de terror, horror e sobrenatural ligados ao Hallowenn onde oferecerรก ao leitor uma mistura de terror, suspense e o encontro com o desconhecido em uma coletรขnea sombria, perturbadora e aterrorizante. 
E por o Halloween simbolizar o perรญodo mais aterrorizante do ano, a Antologia tem um projeto grรกfico diferenciado composto por uma seleรงรฃo de textos de tirar o fรดlego e perder o sono.

Fotos:
Foto: Capa do livro
Foto: trecho do conto " As mulheres que viravam patas" - {...}que venha claro como dia, o segredo revelado, nรณs voamos por cima, arvoredo vai por baixo"
Foto: Autora Evelyn Veiga
Foto: sinopse do livro "contos e poesias aterrorizantes reunidas no livro
 em homenagem ao Hallowen"
Foto: eu com o livro๐Ÿ˜

Compre no site: Travassos Editora

Dica de Leitura: Antologia POE

Foto: Livro "Antologia POE"

SINOPSE:
Conhecido por suas histรณrias que envolvem o mistรฉrio e o macabro, uma mistura do horror gรณtico e do romantismo sombrio, Edgar Allan Poe รฉ o homenageado nesta obra. Foi um dos maiores escritores de sua รฉpoca, criador de gรชneros literรกrios e uma literatura emblemรกtica, envolvida por metรกforas e conotaรงรตes. Alรฉm disso, Poe destaca-se por ter sido um dos primeiros autores norte-americanos de contos, e por ter tentado ganhar a vida por si sรณ com a escrita.
Antologia POE
Fotos:
Foto: "eu me tornei insano, com longos intervalos de horrรญvel sanidade"

Foto: contra-capa
Foto: Poema "O corvo"
Foto: Conto "Os olhos de Eurรญdice"
Foto: O corvo ilustrado
Foto: Autores selecionados
Foto: Biografia de Edgar Allan Poe
Foto: Contos e poesias gรณticas reunidos no livro em homenagem a Edgar Allan Poe
Foto: Evelyn Veiga 
Sobre Edgar Allan Poe:
Nesta antologia reunem-se 13 autores com enigmas para serem descobertos inspirados na literatura de Poe. Aprecie e descubra a envolvente narrativa do goticismo.

Cabelos desalinhados, olhar provocador, abismos no lugar de olheiras, lรกbios cinicamente desenhados: antes mesmo dos textos que escreveu, o retrato de Edgar Allan Poe jรก causa estranhamento. Se alguรฉm que nunca o tenha visto lhe lanรงar um relance, fatalmente retornarรก o olhar. Fatalmente se inquietarรก diante da expressรฃo ora enigmรกtica, ora melancรณlica, mas sempre desafiadora do autor estadunidense. Isto acontece porque o retrato de Poe รฉ tambรฉm o de sua vida. Sua breve e tumultuada vida, que comeรงa em 19 de janeiro de 1809, em Boston, e se encerra em 07 de outubro de 1849, em Baltimore. 

O retrato de um rosto esculpido pela genialidade, mas tambรฉm vincado pelo desequilรญbrio, pelo รกlcool e por uma incontrolรกvel tendรชncia ร  autodestruiรงรฃo. Segundo filho dos atores David Poe e Elizabeth Arnold (tinha um irmรฃo mais velho e uma irmรฃ mais nova), Edgar perde ambos antes de completar trรชs anos. ร‰ adotado logo depois pelo rico casal John Allan e Frances Kielling Allan, de Richmond. Com a adoรงรฃo, a crianรงa recebe boa educaรงรฃo e viaja pelo velho mundo – a famรญlia morou por cinco anos na Inglaterra. Mas, ainda que a infรขncia tenha sido marcada por alguma calmaria, Poe nรฃo demora a apresentar o violento temperamento que o caracterizou, desde sempre, como enfant tรฉrrible. Conforme cresce, vai acumulando repreensรตes e sendo expulso das escolas em que estudava. Em 1824, quando ingressa na Universidade de Charlottesville, Poe jรก se destaca pela inteligรชncia e pela destreza fรญsica (chega a nadar por 11 quilรดmetros contra a poderosa corrente do rio James, na Virgรญnia, somente pela faรงanha). Mas o comportamento provocador, as apostas e, principalmente, a bebida logo passam a causar problemas mais sรฉrios. Pouco depois, Poe recebe um irrecusรกvel convite para se retirar da instituiรงรฃo. Isso leva o relacionamento com o pai adotivo, jรก um tanto turbulento, ร s raias do inviรกvel. Nos anos seguintes, segue-se um perรญodo obscuro em sua vida, durante o qual se sabe apenas de frequentes viagens para fora do paรญs. Na ocasiรฃo, Poe jรก escreve poesia, vindo a publicar seu primeiro livro, Tamerlane e outros poemas, em 1827.

Em 1829, resolve seguir carreira militar e รฉ admitido na conhecida Academia de West Point; mas รฉ novamente afastado por indisciplina. Neste mesmo ano seu segundo livro, Al Aaraaf, Tamerlane e poemas menores, รฉ publicado. O terceiro, Poemas, vem em 1831, quando Poe vai morar com a tia Eliza Clemm, em Baltimore. Mas a rebeldia do temperamento nรฃo se atenua. Pelo contrรกrio: a obsessรฃo pela contravenรงรฃo o leva a colecionar problemas e desafetos. Para piorar, as complicaรงรตes pessoais se acumulam. Apรณs o falecimento da mรฃe adotiva, o pai se casa com uma mulher mais jovem, que lhe dรก dois filhos. Assim, Poe fica impedido de se tornar herdeiro da fortuna paterna e decide se afastar de vez. Apรณs enfrentar tempos de verdadeira penรบria, comeรงa a participar de concursos literรกrios. E vence o da revista Baltimore Saturday Visitor com o conto Manuscrito encontrada em uma garrafa. Na mesma รฉpoca, tambรฉm conquista prรชmios nas categorias de poesia e conto do periรณdico Southern Literary Messenger, o que abriu as portas para um perรญodo de (relativa) prosperidade. O fundador do Southern... convida Poe a dirigi-la. Como editor e crรญtico, ele passa a demonstrar todo o seu talento e sua sensibilidade estรฉtica. Escritor maduro, sรณ faz refinar sua tรฉcnica nos contos, poemas e resenhas literรกrias que produz. A revista se impรตe como referรชncia, e Poe atinge notรกvel status no meio, de modo que a relativa estabilidade profissional se estende ร  vida pessoal: ainda morando com a tia, ele acaba por se casar com a filha dela, a prima Virginia Clemm, de apenas 13 anos, em 1836. Mas a calmaria nรฃo dura muito mais. Ao cabo de dois anos, o incorrigรญvel Poe tateia o terreno movediรงo rumo ao abismo alcoรณlico, o que devasta a boa relaรงรฃo que tinha com o patrรฃo: acaba demitido. Desempregado, novamente decide mudar de ares e parte, com Virginia, para Nova Iorque. Lรก รฉ publicado, em 1838, seu texto mais longo, A narrativa de Arthur Gordon Pym. Seguem-se novamente alguns anos de certa tranquilidade, durante os quais Poe produz intensamente.

Sรฃo dessa รฉpoca as suas obras mais famosas. Como vรกrios dos Contos do Grotesco e do Arabesco, tambรฉm conhecidos como Histรณrias extraordinรกrias e que incluem A queda da casa de Usher, de 1840, Assassinatos da rua Morgue (considerada a primeira histรณria genuinamente detetivesca da literatura), de 1841, O corvo e outros poemas, de 1845, entre outras. Mas, apesar do reconhecimento, Poe segue esbarrando nas dificuldades arquitetadas pelo seu prรณprio gรชnio. E continua incapaz de proporcionar, a si e ร  mulher, uma vida minimamente digna. Isso agrava o jรก combalido estado de saรบde de Virginia, que, pouco depois, em 1847, morre de tuberculose. A partir daรญ a ruรญna รฉ total. Se antes Poe caminhava lentamente para o suicรญdio, agora corre a passos largos. E o faz com vigor, bebendo cada vez mais, comportando-se de forma violenta e sofrendo seguidos ataques de delirium tremens. Atรฉ que, no outono de 1849, durante um tour literรกrio que promove para angariar fundos, um anoitecido Poe entra em uma taberna de Baltimore; e lรก consome suas รบltimas horas em bebedeira selvagem. Existem controvรฉrsias sobre as causas da morte. Hรก quem diga que foi o alcoolismo; hรก quem garanta que foi assassinato; e hรก quem acredite nas mais diversas doenรงas. O fato รฉ que, naquela รบltima noite, jรก avanรงada, quase parindo o dia, Poe cambaleia para fora da taberna e sai perambulando pelas ruas. Atรฉ que o vento noturno, velho conhecido e tรฃo inspirador em outras รฉpocas, visita-o uma รบltima vez. Como de costume, o sopro anuncia-se pelo apagar das velas nos postes e pelo ranger de portas distantes. E o ataca, desta vez mais implacรกvel do que nunca, para extinguir-lhe a chama da existรชncia. Pouco antes do amanhecer, Poe รฉ encontrado inconsciente e levado ao hospital Washington College – onde, com 40 anos, vem a falecer. ร‰ enterrado sem qualquer cerimรดnia em uma vala comum do cemitรฉrio local.

Como se vรช, nรฃo รฉ ร  toa que Poe permaneรงa atรฉ hoje. Ao absorver a tragรฉdia – a prรณpria e a alheia – para nos devolver relatos que causam estranheza e fascรญnio, o autor se coloca ao lado de Guy de Maupassant, Tรฉophile Gautier, Ambrose Bierce e tantos outros atentos observadores das minรบcias secretas do cotidiano do sรฉculo XIX. A diferenรงa รฉ que, em Poe, a criaรงรฃo literรกria se dรก com rigor inรฉdito. Embora de comportamento incorrigรญvel, ele considera sagrada a disciplina ao escrever. Nesse sentido, รฉ tirano, atรฉ – basta conhecer as ideias expostas em textos como A Filosofia da Composiรงรฃo, O Princรญpio Poรฉtico e Marginalia. Crรญtico implacรกvel, poeta exigente e contista inventivo, Poe pratica o que prega. Os movimentos de sua pena nรฃo parecem ser senรฃo os de um espรญrito tumultuado, os rodopios de uma alma insatisfeita. Os rompantes de seu texto nรฃo sรฃo senรฃo as sinuosidades de seu temperamento. Nรฃo surpreende que ele responda por um estilo atรฉ hoje cultuado, que vai das exclamaรงรตes ร s reticรชncias, como o esgrimista que ataca e se defende na hora exata.

E รฉ por esta capacidade de escrever com a prรณpria vida que Poe se tornou, tambรฉm, o grande personagem de si prรณprio. Antes de Roderick Usher, de Arthur Gordon Pym ou de William e Wilson, foi Poe, e ninguรฉm mais, a principal vรญtima de neuroses transmutadas em atrocidades, o acossado pelas sombras, o perseguido e o perseguidor, o obcecado por aquilo que oculta o espesso vรฉu do cotidiano. Melhor para nรณs que, em meio a tanto tumulto, Poe ainda tivesse tempo para empunhar a pena. E que, inacreditavelmente lรบcido, conseguisse gravar no papel a marca perene do gรชnio. Crรญtica por: Oscar Nestarez Revista: Galileu Depois de uma crรญtica incrรญvel, biografia e sensรญvel sobre Poe, รบnico e genial. Fica as nossas apresentaรงรตes de capa completa que envolverรก todo o conteรบdo que se descobre no goticismo e segue pelo romantismo sombrio.

9 de fevereiro de 2021

Os Olhos de Eurรญdice - Contos

O lugar onde duas irmรฃs buscaram abrigo em uma noite de tempestade nรฃo passava de um casebre no qual o tempo jรก tinha devorado quase todo o alicerce, no รบnico cรดmodo que se mantinha em pรฉ, havia quadros espalhados pelas tortuosas paredes, as pinturas eram estranhas e passavam uma sensaรงรฃo angustiante. 

Encolhidas em um quanto, esperando o fim da tormenta, as irmรฃs observavam uma pintura ainda presa ao cavalete, logo abaixo uma inscriรงรฃo do que era mostrado na tela, entre os clarรตes dos raios que passavam por entre as rachaduras, puderam ler e perceber que ele contava tambรฉm a histรณria de duas irmรฃs.
Eurรญdice era uma mulher jรก idosa, no alto de seus oitenta anos, viveu plenamente, mesmo na pobreza, buscara tirar o melhor de tudo. Tinha diante de seus olhos a conquista ao sabor do vento, de coisas e pessoas insignificantes, mas verdadeiras. 

Nada a impedia de ajudar a quem precisasse, sua aura refletida pelo olhar, emanava o mais alto grau da simplicidade, seus olhos mostravam atรฉ mesmo a contemplaรงรฃo do infinito, tudo isso resguardado pelas rugas de seu rosto.

Sua irmรฃ, Maria, desejava mais que qualquer coisa, o poder de ver o mundo atravรฉs daquele olhar. Para conseguir algo mostrava olhos de cobiรงa e inveja, nรฃo conseguia arrancar palavras de admiraรงรฃo sincera de ninguรฉm, jรก que para ajudar o prรณximo, fazia apenas para satisfazer os seus prรณprios interesses.

Maria entรฃo decidiu que queria ter a sensaรงรฃo plena dos olhos de Eurรญdice, talvez a irmรฃ mais velha nรฃo tivesse mais muito tempo pela frente e aquele olhar fluรญdo de perpรฉtua paz, estaria para sempre, perdido. Convidou entรฃo a irmรฃ para posar para um retrato, seria uma homenagem singela e um presente para ela. Eurรญdice que nunca percebera o olhar malรฉvolo da irmรฃ, concordou, mas pediu que o quadro foi feito em sua pequena casa, pois mostraria assim a forma simples em que vivia.

Ao chegar no quarto, Maria foi tomada de sรบbito, pelos mais terrรญveis sentimentos, raiva, cobiรงa, รณdio em estado puro, na sua frente nรฃo tinha mais que uma cama e uma cรดmoda, objetos simples, nada que despertasse o interesse, mas em Maria, ardia o desejo inexplicรกvel de ter tudo aquilo.
Ao posar para o retrato, Eurรญdice ficava defronte a irmรฃ, parecia estar rodeada por um estado de graรงa que cobria todo o ambiente, seus olhos refletiam a imagem da irmรฃ enquanto pintava, mostrando o reflexo do desespero, ira, maledicรชncia e sobretudo, da ambiรงรฃo.

Conforme as horas iam passando, Maria estava cada vez mais obcecada nos olhos de Eurรญdice, a cada pincelada, um pedido era feito do fundo de sua alma para que pudesse viver daquela maneira pelo menos uma vez, enquanto a irmรฃ posava, seu olhar estรกtico fazia ร  vontade jรก sobre-humana aumentar, chegando ao ponto de Maria se levantar e gritar, dizendo que tinha terminado e enfim, conseguido. 

Em completo รชxtase, desabou morta ao chรฃo, Eurรญdice ao examinar o quadro, notou que a irmรฃ pintara um autorretrato, mas com os seus olhos no lugar dos olhos dela.
Em completo รชxtase, desabou morta ao chรฃo, Eurรญdice ao examinar o quadro, notou que a irmรฃ pintara um autorretrato, mas com os seus olhos no lugar dos olhos dela.

 Os Olhos de Eurรญdice
Evelyn Veiga

15 de novembro de 2020

Dica de Leitura - Histรณrias para Ler e Morrer de Medo

Histรณrias para ler e morrer de medo
Antologia
Sinopse: 
Existem histรณrias que foram contadas e passadas de pai para filho e que com o tempo tornaram-se fictรญcias, mas que originaram-se de histรณrias verdadeiras, como no caso da Loira do Banheiro e tantas outras que hoje nรฃo passam de lendas urbanas.
Em "Histรณrias para ler e morrer de medo", organizada pelo escritor, editor e ativista cultural Ademir Pascale, o leitor encontrarรก histรณrias que farรฃo atรฉ os mais corajosos estremecerem.
O livro conta com 19 autores, incluindo esta moรงa que vos escreve neste blog.
Separei o meu conto mas tambรฉm tem no e-book completo. 

4 de novembro de 2020

Contos: O Jardim da Casa Desconhecida

 
Jรก estava entardecendo, mas eu ainda conseguia ver o jardim. Despertei em meio a uma paisagem natural, um bosque com trilhas, รกrvores e pedras ao redor, o meu olhar se perdia por entre pinheiros, bรฉtulas, tรญlias, carvalhos que pareciam ter sรฉculos de idade e salgueiros com seus ramos longos e pendentes.

Ao meu redor vรกrios arbustos, veigelas floridas se destacavam fazendo o contorno dos troncos das รกrvores, hortรชnsias, narcisos, violetas, jasmins, gerรขnios, sรกlvias-vermelhas, lavandas, margaridas, verbenas e camรฉlias adornavam um lago coberto por ninfeias e vitรณrias-rรฉgias, alรฉm de muitos outros elementos que cresciam sem nenhuma intervenรงรฃo humana. Ao levantar, notei estar cercado por esculturas de gesso, estranhas estรกtuas de homens e mulheres velhos, vestiam roupas comuns, um menino com uma boina e sapatos gastos, uma menina de vestido, tinha lรกgrimas escorrendo pelo rosto e se agarrava a uma boneca, todos pareciam ter uma expressรฃo de profunda tristeza e sofrimento.

Olhando a paisagem percebi uma coisa, nรฃo me lembrava de como tinha chegado atรฉ este lugar, de ter saรญdo para caminhar, passado pelas รกrvores e de me deitar em meio a clareira. Quando fiquei totalmente desperto, nรฃo via ou ouvia nenhum animal, em meio a tantas flores nรฃo escutava abelhas zumbindo, besouros ou grilos voando sobre as folhas, nem mesmo aranhas tecendo suas emaranhadas teias e no lago nรฃo havia peixes, sapos ou salamandras, nem mesmo libรฉlulas danรงavam na superfรญcie da รกgua.

Parei um pouco para reorganizar as ideias, busquei olhar mais ร  frente, para o horizonte, talvez assim conseguisse me localizar alรฉm do bosque, olhava para cima, nรฃo sabia a hora exata, mas naquele momento o cรฉu รฉ uma aquarela de infinitas cores. Um vislumbre ver sol e lua ao mesmo tempo, a dama de prata surgindo ao leste, o sol jรก se pondo ao oeste e para o meu contentamento, embaixo do cรญrculo dourado que estava ficando com tons de laranja e vermelho, estava a silhueta gigantesca de uma construรงรฃo, primeiro monumento feito pelo homem que avistava em meio a natureza.
Eu provavelmente devia ter vindo de lรก, pois nรฃo conseguia identificar nenhuma outra edificaรงรฃo em nenhuma outra direรงรฃo. Talvez, ao me afastar demasiadamente da casa, eu tenha parado para descansar, caรญdo em sono profundo e conseguido despertar apenas ao entardecer.

Mesmo aliviado por ter para onde ir e seguir a diante pelo caminho da alameda, fui tomado por um sentimento de tensรฃo, a cada passo dado, sentia como se alguรฉm ou alguma coisa me observasse, tentava nรฃo alimentar essa sensaรงรฃo pois nรฃo havia ser neste lugar que caminhasse alรฉm de mim, nรฃo havia vida humana neste bosque alรฉm da minha. Deixei os temores de lado e comecei a andar para alcanรงar a casa, pelo tamanho monumental do contorno que ela projetava no horizonte parecia ser uma mansรฃo com muitos cรดmodos.
Segui andando, mas, algo peculiar acontecia, apesar de caminhar bastante e de sentir o tempo passar, nรฃo parecia nem um pouco que tinha me aproximado da casa, sua posiรงรฃo era a mesma, ao olhar para o cรฉu, o sol ainda nรฃo tinha se posto, o tom alaranjado e vermelho jรก estavam me deixando nervoso, a lua nรฃo chegou no seu apogeu, o vรฉu da noite nรฃo cobriu o cรฉu, tรฃo pouco trouxe a resplandescรชncia das outras estrelas. O cรฉu que contemplei com tamanha admiraรงรฃo hรก pouco tempo, era o mesmo que naquele instante me deixava incomodado e aflito.
A paisagem antes exuberante que me despertava atenรงรฃo tambรฉm jรก estava perdendo o seu brilho, pois seguia incessantemente e nada parecia mudar, as mesmas flores, a mesma trilha. Percebi algo perturbador, o lago nรฃo tinha borda, nรฃo enxergava caminho para chegar atรฉ a margem, naquele espaรงo sรณ existia escuridรฃo.
Nรฃo tinha como eu estar andando em cรญrculos, a estrada nรฃo fazia curvas, a casa, ou seja, lรก o que aquilo fosse, continuava no horizonte, sol e lua ganharam um aspecto detestรกvel de minha parte, nรฃo se moveram nem por um momento de seus lugares, eles, juntamente com as estรกtuas, flores e รกrvores eram privilegiadas ao assistirem a minha caminhada desafortunada.
Por um tempo fiquei sem saber o que fazer, nรฃo sabia se pernoitava no caminho e continuava na manhรฃ seguinte, com a luz do dia para me guiar ou se continuava dessa forma, caminhando sem chegar a lugar algum. De repente pensei na possiblidade de passar a noite aqui, mesmo que nรฃo tivesse visto nada que pudesse ameaรงar a minha vida, tinha essa sensaรงรฃo horrรญvel e sufocante, o ar denso, sem vento, junto as estรกtuas me observando, devia ser ainda pior na escuridรฃo e no silรชncio da madrugada. Decidi entรฃo ir caminhando, mesmo indo devagar pela trilha era melhor do que ficar parado.
No fim de tarde รฉ costume ventos do leste abrandarem o calor, mas, nem mesmo uma brisa balanรงava as รกrvores, pareciam feitas de pedra, seriam mais bonitas com o farfalhar das folhas, com o cantar dos pรกssaros em seus galhos, com o voo de joaninhas e borboletas pelas plantas, mas, nada acontecia, sentia um enorme cansaรงo, mesmo achando que adormeci por vรกrias horas, minhas forรงas se dissipavam.
O estado em que as coisas se encontravam era tรฃo bizarro que fiquei sem tomar nenhuma atitude relevante alรฉm de caminhar, tinha perdido a noรงรฃo do tempo, caminhava como se fosse uma missรฃo a realizar, uma sentenรงa a cumprir, por um momento me sentia conformado, mas, isso mudara em um instante, pois mais ร  frente, o medo voltou a tomar meu corpo, o sentimento de pavor tomava a minha mente por completo, notava alguรฉm muito prรณximo de mim e tive a nรญtida impressรฃo de ter sido tocado, de sรบbito me virei para trรกs como se algo estivesse lรก, mas nรฃo havia ninguรฉm, olhava para os lados, procurando alguรฉm ร  espreita, mas, nada. Os รบnicos olhos alรฉm dos meus eram os das estรกtuas, a mais prรณxima era de uma crianรงa, uma menina de vestido, sapatilhas e tranรงas no cabelo, com o rosto voltado para cima, olhos suplicantes para o cรฉu, cรฉu este que nem queria mais contemplar.

Nรฃo sei se minha mente estava a pregar peรงas ou a me alertar, se o meu cansaรงo me traรญa ou me ajudava. Em questรฃo de segundos, por puro instinto, comecei a correr, mas de maneira displicente nรฃo fui muito longe, tropecei, no meio do caminho tinha uma pedra, tentei ficar de pรฉ, mas em vรฃo, nรฃo consegui conter a queda e me lancei em direรงรฃo as flores, belos montes de violetas e lavandas amorteceram meu corpo, jรก as pobres coitadas ficaram destruรญdas, despetaladas, com os ramos quebrados e as folhas caรญram no chรฃo. Consegui levantar, atordoado, pensei em praguejar e amaldiรงoar o lugar, mas eu nรฃo precisava, jรก era um local maldito sem o desejo de ninguรฉm. No entanto, depois desse evento, alguma coisa aconteceu.
Quase que imediatamente, uma forte ventania balanรงou tudo ao meu redor, me lanรงando em direรงรฃo a silhueta da casa e, tamanha a surpresa, a paisagem tinha mudado, finalmente avistei algo inรฉdito, o fim da alameda. Cheguei em um cรญrculo gramado e no meio um enorme arco gรณtico, esculpido e ornamentado com flores, embaixo, uma tรกvola redonda com vasos cheios de belรญssimas rosas. Seguindo o novo caminho, largo, delimitado por canteiros de murtas e com uma grande escadaria que descia em direรงรฃo a outro jardim, este parecia estar sobe os cuidados de alguรฉm e o melhor de tudo, a mansรฃo parecia estar mais prรณxima.
Os caminhos estavam bem definidos, de contornos rรญgidos com cercas vivas de formas geomรฉtricas planejadas, os arbustos compactos, perfeitamente cortados eram de um verde tรฃo escuro e denso que pareciam ter sidos pintados ร  mรฃo.

Nessa parte do jardim, ciprestes podados em triรขngulos agudos, surgindo mais ร  frente, bancos adornados com pedras pretas, colunas elevadas com os topos cobertos de rosas e grandes globos luminosos. As รบnicas coisas que restaram do jardim anterior foram as estรกtuas, mas estas eram maiores, mais bonitas e feitas de mรกrmore, corpos de mulheres de esplรชndida beleza em trajes cerimoniais e homens com grande estatura e mรบsculos aparentes, ao olhar atentamente para elas, percebei uma caracterรญstica das estรกtuas vistas no bosque, todas elas possuรญam semblante triste e desesperado, como se no momento em que foram esculpidas, estivessem olhando para a morte.
Os espaรงos a minha frente foram milimetricamente pensados, estava certo de que os monumentos foram construรญdos por mรฃos humanas, assim como a mansรฃo, fazendo com que os jardins fossem uma extensรฃo da casa, ela jรก aparecia alรฉm do contorno, tinha janelas imensas, adornadas por esculturas de pedra e com vidros completamente pretos, no entanto, ainda nรฃo conseguia ver como chegar atรฉ ela.
Os traรงados dos caminhos foram cobertos com cimento e placas de cerรขmica, delimitados por cercas vivas muito fortes, com estrutura lenhosas, feitas de viburno podado, formando um canteiro perfeito para a as flores, essas, bem diferentes, nรฃo cresciam mais sozinhas a esmo pelo chรฃo, foram escolhidas para harmonizar o espaรงo, para serem esculpidas e comportadas em cachepรดs, vasos decorados e canteiros de vรกrios metros de extensรฃo e altura. Rosas brancas, rosas do รฉden, amarelas e vermelhas, enormes e com espinhos maiores ainda, caules tรฃo verdes que nem se assemelhavam a algo natural, mas sim com estruturas de ferro e com folhas gigantescas.
No chรฃo um caminho inteiro revestido de amor-perfeito, tulipas amarelas, vermelhas e azuis formavam figuras geomรฉtricas, losangos, triรขngulos, cruzamentos, todos iam em direรงรฃo a uma grande fonte e no centro dela, um imenso chafariz de onde jorrava รกgua cristalina. Ao final de cada gigantesco retรขngulo havia pergolados com caramanchรตes no topo, eu ficava parado embaixo deles para tentar recuperar as forรงas, estava extremamente cansado, nรฃo tinha feito nada alรฉm de dar voltas nesse jardim de proporรงรตes colossais, sem nenhuma esperanรงa de conseguir sair.
Aquela poda escultural das vegetaรงรตes, a simetria, estavam me deixando enjoado, centenas de metros nessa perspectiva, em meio ร quela organizaรงรฃo, sem nada fora do lugar, como tudo aquilo estava tรฃo bem podado, aparado, vasos com arbustos completos, plantas amarradas em uma perfeiรงรฃo que me deixava agoniado, nรฃo existia nada, alรฉm de flores, vasos, canteiros, trilhas, encruzilhadas, fontes, estรกtuas, mas nenhuma simples formiga, centopeia ou lagarta passeava pelo chรฃo, o รบnico barulho que quebrava o silรชncio era a queda d’รกgua do chafariz.
Mesmo ao livre eu jรก estava sufocando, queria gritar, chamar alguรฉm, nรฃo tinha pensado nisso antes, tinha que chamar por socorro, as pessoas que cuidavam do jardim viriam me ajudar, gritei com as forรงas que me restavam, mas nรฃo veio uma sรณ alma. Mais uma vez comei a correr, apenas passando pelos caminhos intocados, sem defeitos, alรฉm de nunca ter conseguido ver alguma passagem para chegar atรฉ a casa, nรฃo tinha ponte, portรฃo, muro, nada alรฉm de arbustos grandes, apesar de parecer mais prรณxima desde quando comecei essa jornada, ela ainda estava inatingรญvel, parecia nรฃo existir ninguรฉm dentro da casa que pudesse me ver do lado de fora, infinitas janelas, mas nenhuma aberta, cercadas por vidros intransponรญveis, nada devia passar por eles, nem mesmo a minha imagem.
Entรฃo, veio a minha cabeรงa, uma ideia assustadora, um temor percorreu todo o meu corpo, se estava preso aqui fora sem ninguรฉm na casa para me ver e ouvir, talvez, pessoas lรก dentro estivessem presas tambรฉm. E eu como um louco querendo entrar. Nรฃo havia outra explicaรงรฃo, empregados deviam receber ordens para deixarem as pessoas presas, sim, essa casa teria que ter empregados, alguรฉm deveria ser encarregado de cuidar dessas malditas flores, podar os arbustos e limpar a fonte.
Comemorei cedo demais, o sentimento de derrota tomava conta de tudo, mais uma vez fiquei desnorteado, nรฃo entendo como vim parar nessa situaรงรฃo, nรฃo me lembrava se alguรฉm me trouxera atรฉ aqui ou se fui convidado e vim de espontรขnea vontade. Nรฃo tinha mais forรงas, caรญ de joelhos e sem querer voltei a olhar para o cรฉu, agora mudado, o sol enfim estava se pondo, a lua brilhava esplendorosa, como um pincel descarregando a tinta na รกgua e os traรงos pretos azulados da noite empurravam os รบltimos raios vermelhos para o oeste pintando constelaรงรตes magnรญficas por todo o cรฉu.

Tal cena ficou impressa nos meus olhos, presa para sempre em minha mente, nรฃo permitiria mais que o pavor e o medo me controlassem, mesmo nรฃo querendo, a casa era o รบnico lugar para o qual poderia ir.  Comecei a pensar no que poderia ter me feito sair do outro jardim. Depois de caminhar por horas e ver as mesmas coisas passarem centenas de vezes, o รบnico acontecimento diferente foi ter tropeรงado e caรญdo sobre os arbustos e estragar algumas flores. Quem sabe o fato de ter alterado o estado “perfeito” das coisas, tivesse perturbado a entidade que mora aqui e que tenha montado tudo isso, pois somente um ser de outro mundo para fazer essas coisas sem a presenรงa de outras pessoas. Talvez ela nรฃo gostasse que mexessem nas suas flores e estragassem seu trabalho, ficaria furiosa se pisassem na grama tรฃo bem cortada e arrancassem as plantas de seus vasos. Eu poderia estar apenas tendo pensamentos loucos, mas eu nรฃo tinha mais nada a fazer a nรฃo ser tentar.
Sendo assim, saรญ correndo pela grama, com chutes, arranquei vรกrios tufos, fazendo inรบmeros buracos, joguei terra pelo belo caminho polido, tirei vรกrios picos dos ciprestes podados, pisei nas azaleias, amassei as tulipas, subi nos canteiros pisoteando as murtas com toda forรงa, escalei as pรฉrgolas e puxei os caramanchรตes, me transformei no vento forte que eu queria que aparecesse e me levasse embora.
O que mais chamava atenรงรฃo nesse jardim com certeza eram as rosas, parti enraivecido para cima de todas que encontrei, com elas destruรญdas, certamente alguรฉm viria e eu aproveitaria a oportunidade para fugir. Derrubei dezenas de vasos, as rosas caรญam aos montes pelo chรฃo, pisei nos ramos, arranquei pรฉtala por pรฉtala, rasgava e picava as folhas em milhares de pedaรงos, minha fรบria era tanta que nem percebi que enquanto atacava era tambรฉm golpeado, os espinhos furaram cada centรญmetro das minhas mรฃos, meus braรงos, pescoรงo e rosto foram cortados, o sangue manchava minhas roupas, caรญa nas rosas e pingava pelo caminho, mesmo depois de tudo isso nada aconteceu.

Eu estava ofegante, desesperado, cansado e sangrando tambรฉm, senti o gosto de sangue descer pela garganta, eu iria morrer naquele lugar, envenenado pelos espinhos das roseiras. Esgotado, olhei para a casa que nunca alcancei, nem saberia se estaria a salvo se chegasse atรฉ ela, jรก desorientado, caminhei lentamente atรฉ a fonte no centro, morreria, mas tinha feito um belo trabalho destruindo aquele jardim amaldiรงoado, entrei na fonte, manchei a รกgua lรญmpida com meu sangue, estendi minhas mรฃos atรฉ o chafariz, aparei a รกgua e bebi, os goles pareciam infinitos, como se fosse a รบltima vez que tomava o elixir da vida, tirei minhas vestes e me banhei na fonte com รกgua tingida de vermelho.
Meu corpo ficaria preso junto as estรกtuas para sempre, minha mente em devaneio pensava que talvez elas tivessem sido pessoas reais antes de tudo, desistiram de procurar uma saรญda e morreram. Como em um รบltimo ato de uma รณpera que termina em tragรฉdia, mergulhei esperei pelo meu fim, mas ao invรฉs de sentir a morte se aproximar, o que eu vi parecia ser um milagre, cristais emergiram e brilhavam na superfรญcie da รกgua, puxando o รบltimo ar de meus pulmรตes, me levantei, senti uma brisa leve a soprar e tocar meu rosto molhado, a lua pairava a cima da mansรฃo, ao olhar para a casa, todas as janelas estavam se abrindo, raios de uma luz extremamente branca emanavam do interior, duas grandes portas se abriram e diante delas uma passarela de mรกrmore ia surgindo, possuรญa  dezenas de metros e chegava atรฉ a fonte, atรฉ mim.
Nรฃo acreditava no que estava vendo, mesmo assim nรฃo pensei em mais nada a nรฃo ser levantar e ir em direรงรฃo a porta, me debrucei sobre o beiral, fiz uma forรงa sobre-humana para sair da fonte. Cambaleante, andei pela passagem e chegando enfim diante das portas abertas, entrei.

Eu estava ofegante, desesperado, cansado e agora sangrando tambรฉm, senti o gosto de sangue descer pela garganta, eu iria morrer nesse lugar, envenenado pelos espinhos das roseiras. Esgotado, olhei para a casa que nunca alcancei, nem saberia se me salvaria se chegasse atรฉ ela, jรก desorientado, caminhei lentamente atรฉ a fonte no centro, morreria, mas tinha feito um belo trabalho destruindo aquele maldito jardim, entrei na fonte, manchei a รกgua lรญmpida com meu sangue, estendi minhas mรฃo atรฉ o chafariz e aparei um pouco d’รกgua e bebi, goles infinitos de รกgua, como se fosse a รบltima vez que tomava o lรญquido dava a vida, tirei minhas vestes e me banhei na fonte, agora com a รกgua tingida de vermelho.

Como em รบltimo ato de uma รณpera que termina em tragรฉdia, esperei pelo meu fim, mas ao invรฉs de ver a morte se aproximar, o que eu vi parecia ser um milagre, senti uma brisa leve tocar meu rosto, a lua pairava em cima da mansรฃo, ao olhar para a casa, todas as suas janelas estavam se abrindo, no interior, luzes comeรงaram as surgir e como por puro encanto, duas grandes portas se abriram e diante delas uma passarela era feita instantaneamente e chegava atรฉ a fonte, atรฉ mim.

Nรฃo acreditava no que estava vendo, mas mesmo assim nรฃo pensei em mais nada a nรฃo ser levantar e ir em direรงรฃo a porta. Cambaleante, me debrucei sobre o beiral, fiz uma forรงa sobre-humana, saรญ da fonte e caminhei pela passagem, cheguei atรฉ as portas abertas e entrei.

O Jardim da Casa Desconhecida

Evelyn Veiga

25 de outubro de 2020

Padaria Lopes - Contos

O dia na padaria mais tradicional da cidade comeรงa como todos os outros, pessoas apressadas que mal se sentam para comer e jรก vรฃo saindo, mas, satisfeitas com o cafรฉ da manhรฃ. Com um balcรฃo imenso, com todos os tipos de pรฃes bolos e doces possรญveis. 

O movimento se mantรฉm durante todo o dia, todos os produtos expostos nos balcรตes sรฃo vendidos, entรฃo durante a noite รฉ preciso fazer mais, รฉ aรญ que o padeiro aparece.

Movendo-se com maestria, o padeiro muito querido pelos clientes, faz com prazer o seu trabalho e tรฃo logo o relรณgio vira a meia-noite, ele se encaminha, animado, para a cozinha, depois de entrar e fechar a porta, o padeiro toma a forma no qual consegue fazer os melhores pรฃes, forma que ninguรฉm desconfia, a versรฃo mais grotesca e macabra, ele se apronta para a melhor tarefa, consagrar os alimentos feitos naquele lugar para o seu Senhor, sempre fiel, o padeiro oferece todas as coisas feitas na padaria para o diabo.

Para o trabalho as roupas jรก nรฃo mais necessรกrias, sรฃo usadas apenas para o deleite dos clientes, tambรฉm nรฃo cabem mais no corpo agora transfigurado, jรก que suas pernas, braรงos e pescoรงo se alongam ao ponto de parecer nรฃo ter mais ossos, assim fica mais fรกcil de se movimentar pela cozinha e usar os ingredientes, estes sรฃo encontrados em um lugar muito diferente, jรก que os consegue tirar de seu prรณprio corpo, um presente dado pelo demรดnio, para que suas matรฉrias-primas nunca se esgotem.

O padeiro usa a sua prรณpria pele, รฉ muito saborosa e vai ajudar a compor a massa, de suas mรฃos saem garras imensas, com elas, arranca a camada adiposa, a coloca na batedeira, junto com ela, sรฃo precisos รกgua e sal, sem problemas para o padeiro, que de sua boca, agora monstruosa, tira os dentes gigantes e afiados, um por um sรฃo moรญdos e transformados em pรณ, com a lรญngua gordurosa e comprida, mastiga a boca desdentada para produzir uma saliva que nรฃo tem fim, ela รฉ a รกgua que vai moldar o pรฃo. 
Para findar o preparo, falta apenas o fermento, o padeiro tem o cabelo tรฃo longo que se espalha pela cozinha, ele os puxa pela raiz e os engole, com o รกcido de seu estรดmago, transforma o cabelo em uma pasta, depois vomita aquele que รฉ o melhor fermento usado na cidade, nenhum outro faz o pรฃo crescer tanto. Enquanto as massas descansam, o corpo despedaรงado do padeiro se regenera, afinal ele trabalha a noite inteira e sempre vai precisar de mais.
Para assar os pรฃes, o melhor forno, de uma fenda no chรฃo, sai um ar escaldante, vindo direto do poรงo infernal, para conseguir fogo, o padeiro corta as prรณprias pernas, as fazendo de lenha, joga embaixo do forno conseguindo labaredas para a noite toda. 
Mesmo sem os membros inferiores, o padeiro nรฃo fica lento, ele usa os longos braรงos para se locomover, pega os pรฃes jรก descansados e os coloca para assar, a noite vai passando e o padeiro continua a trabalhar, usa suas garras para abrir sua barriga e retira seus รณrgรฃos, vai atรฉ o fogรฃo e os coloca na panela para cozinhar, vรฃo se desfazendo, se transformando em geleia para rechear os melhores sonhos aรงucarados.

O dia vem raiando, para terminar o รกrduo trabalho, falta apenas o cafรฉ, para a tarefa o padeiro precisa apenas de uma faca, com um corte limpo e preciso, decepa a prรณpria cabeรงa, que voa pela cozinha, pousando estratรฉgicamente sobre bancada de serviรงo, de lรก ele coordena a queda de seu corpo sobre o fogรฃo, a explosรฃo de seu sangue, vindo de todos os seus vasos sanguรญneos, veias, capilares e artรฉrias extiguem todo o sangue de uma vez, derramando o lรญquido dentro do bule fulmegante, fazendo o sangue ferver instantaneamente, exalando nรฃo o odor ferroso e saguinolento que causa repulsa, mas um aroma adocicado, caracterรญstico dos melhores grรฃos, que acaba invadindo toda a padaria e chamando os clientes para iniciarem mais um dia, indo tomar do mais delicioso cafรฉ e do melhor pรฃo jรก feito.

Padaria Lopes
Evelyn Veiga